A minha primeira Ultra Maratona
Autora: Filipa Ferro
Data: maio 13, 2014
Há experiências que nos marcam.
Temos experiências que na altura achamos o máximo mas que depois desvanecem ao voltarmos à vida mundana. Depois temos experiências que indirectamente alteram toda a nossa forma de estar. Inadvertidamente invadem a nossa zona de conforto e fazem com que uma espécie de “upgrade” da mesma. O ter superado uma ultramaratona foi uma dessas experiências. Houve muito trabalho, muitas horas a treinar e lesões ou pseudo-lesões pelo meio. Houve muitas alturas que roguei pragas ao meu corpo por não me obedecer, houve alturas em que me fartei de chorar porque não seria desta que ultrapassava a barreira dos três dígitos e pior, houve alturas em que pensei mesmo desistir. A ideia de me inscrever nesta prova veio depois de muitos dos meus amigos e alguns colegas de equipa a terem feito. Mas após consultar a página e ter visto toda a sua abrangência, a inscrição tomava cada vez mais um carácter pessoal. Ora, o meu Avô foi militar e senti que fazia sentido dedicar-lhe algo tão imponente. Para além disso, a data em si é muito importante para mim… Dia 11 de Maio foi a data em que o meu Pai fez um transplante de fígado há 5 anos e felizmente está tudo a correr muito bem. Os 101 Km de Ronda passaram a ter um enorme significado. Já não era só a questão de ultrapassar os três dígitos mas poder dedicar algo majestoso a pessoas que foram e são importantes na minha vida. Foram meses com treinos alucinantes. Foram semanas em que tentava conciliar toda a minha vida desde a profissional à pessoal em torno deste sonho. Pelo meio fui conhecendo pessoas maravilhosas que me foram ajudando. Quer nos treinos, quer a ajudar-me psicologicamente para esta aventura. Desde os treinos com o grupo “Correr Lisboa”, aos treinos das quartas com a malta do ginásio, os treinos das quintas com a minha equipa laranjinha, os Run4Fun, e os longões de fim-de-semana com grupos variados. Toda a energia tornava o sonho possível. Às tantas o meu corpo resolveu pregar-me uma partida. Não sei o que tive, mas de repente comecei a ver o sonho a fugir. A sentir a perna como se me tivessem pegado nela e a tivessem colocado ao contrário mas que voltou ao estado normal. Tentava correr e não conseguia. A quase um mês dos 101 de Ronda e eu naquele estado. Não estava a acreditar. Tentava todos os meios alternativos para evitar que algum médico me impedisse de ir. Num treino nocturo anterior à prova voltei a acreditar. Foi lindo ter andado por Monsanto à noite percorrendo os seus trilhos. A vivência por ali tornou a longínqua Ronda possível de atingir. Estava quase e ia ser mesmo possível! Entretanto, e mesmo quase na véspera, num treino rotineiro senti as dores a voltarem. Não sei se era o nervosismo a apoderar-se de mim se o quê. Deixei os treinos de parte e foi descanso absoluto. Foram igualmente nimed’s e adalgur’s à espera que o mal desaparecesse. Só pedia a Deus, que se existisse, numa altura destas não me deixasse ficar mal. E chega o dia da partida para Ronda… Juntou-se um grupo magnífico! Acredito que melhor seria impossível, e acredito que se não fossem estas pessoas, a Carla, o Rui e o Orlando eu nunca teria vivido tão intensamente Ronda. O carácter pessoal começou a ganhar outra dimensão. A força e a energia pré-prova ganhavam mais peso. A dinâmica no levantamento dos dorsais, a palavra “cabrón” que fazia parte das nossas galhofas. A falta de água, pois no hotel em que supostamente o Rui ia ficar mandaram-lhe um mail no qual diziam que não o podiam receber por causa de problemas com a água. O almoço em que “ya no tenemos” quase que fazia parte do menu. A ida para a casa em que íamos estar no fim-de-semana (na qual ficamos deslumbrados com a paisagem e só questionávamos porque é que tínhamos de ir correr no dia a seguir)! A luta pela bandeira de Portugal (disputada entre a Carla e o Orlando) e a envolvência na “Fiesta Pasta”! Sentirmos que Ronda nos estava a acolher com toda a sua beleza. O dia da prova. O nervoso miudinho andava por ali feito bisbilhoteiro dando por vezes azo à excitação para a prova. Encontramos ainda mais grupos de portugueses. Foi lindo ver o companheirismo entre todos, e mágico encontrar ali no meio a grande inspiradora Analice Silva. Esta é uma das verdadeiras Senhoras (e propositadamente com S grande), é uma das pessoas que admiro mesmo e que me inspira. Sempre com um sorriso, sempre alegre, e quando conhecemos a sua história… Sim, ela é que tinha e tem os verdadeiros motivos para se estar a lamentar de tudo e todos… E não… Olha e encara tudo com um sorriso… E mais… Tem 70 anos e vai a estas provas encher-nos de orgulho pela pessoa que é. Confesso que a prova não podia ter começado da melhor forma. De um lado uma campeã e motivadora como a Carla, e do outro a Analice. O sonho quase a concretizar-se! Antes da partida gostei do ênfase com que proclamaram o mítico “Viva España! Viva el Rey! Viva La Legion!”. Tiro de partida. Percorrer parte da cidade com todos os habitantes na rua a dar ânimo a todos os participantes. É uma sensação única! Antes de passar a majestosa ponte sentia um esforço enorme a conter a emoção. Era tudo tão lindo que nos dava ânimo para as longas horas de prova. Estava um calor horroroso, deviam estar perto de “40º à sombra”. Nas vezes em que pensava que ia ter muito tempo para correr lembrava-me das palavras sábias do Rui, “É para ser tranquilo mas não para relaxar muito”. Em rectas e descidas (desde que não fossem muito inclinadas) dava na velocidade, o resto fazia tudo a andar. Evitava perder muito tempo nos abastecimentos e como levei comida preferia comer do que tinha. Às tantas, e antes dos 20 km a minha mochila resolve dar em pateta e fiquei com o fecho na mão. Entrei em pânico, a sorte é que me ajudaram e lá consegui seguir o meu caminho (daqui deu para concluir que em provas destas esqueçam o material dos supermercados…). Foi interessante ver o espírito empreendedor. Quase aos 30 km comecei a avistar barraquinhas a vender água e sumos frescos por 1€. Por acaso já nos tinham prevenido para levar moedas e antes de uma subida enorme foi bom ter bebido quase um litro de água fresquinha! Mais perto dos 60 km cheguei a Setenil e adorei a festa que fazem a receber os participantes. As ruas cheias de gente a gritar por nós. As esplanadas completamente à cunha. E foi interessantíssimo ver a admiração que as mulheres tinham por nós mulheres, cada vez que viam uma rapariga enchiam-se de orgulho e gritavam “Chica, campeona!” Ainda encontrei o José, que tinha conhecido na Maratona de Sevilha, que me foi dando conselhos úteis. Entre os 70 km e o quartel (que se encontrava aos 75.4 km) foi a pior parte da prova. Olhava para o relógio e não via os km’s passarem. Sentia que tinha descoberto o muro dos 100. Em provas de 10 km, aos 7 já estou farta e só quero que acabe, aos 21 essa sensação surge aos 17 e aos 42 km surge aos 35. Nesta prova, perto dos 70 km comecei a ver os camiões militares a transportar a malta que ia desistindo ou sentir-se mal. Até que gostava de experimentar andar numa coisa daquelas, mas não era caso para tanto. Também sentia as minhas mãos inchadas como tudo (talvez do calor ou pelo próprio ácido láctico). Se colocasse umas luvas brancas bem podia competir com o Pato Donald (não o Pato Ultramaratonista). Quando cheguei ao quartel só me apeteceu chorar ao encontrar o “Todo por la Patria”. Retive uns segundos e sorri “Esta é para ti Coronel!”. Ouvir a corneta e fazerem-nos continência foi qualquer coisa de indescritível. No quartel propriamente dito serviam mesmo um jantar. Dado que era tarde, seria bom não parar. Nesse sentido optei por trocar para os ténis de trail e comer apenas o essencial. Já me tinham avisado que a última parte seria pior e por isso pensei em despachar-me para não entrar em cansaço. Também me tinham dito que o quartel era o “cementerio” pois sentava-se para comer e depois não se levantava para terminar a prova. Aos 80 km começaram as subidas em trilhos, só me lembrava da máxima de que onde há uma subida há uma descida. Depois perto dos 90 km senti-me mesmo feliz por ainda conseguir correr. Sentir o vento na cara a dar-me ânimo para continuar. Num ponto alto olho para o telefone e vejo a mensagem da Carla a perguntar se estava no quartel. Não hesitei em ligar-lhe e dizer-lhe que estava quase na meta. Ganhei mais ânimo para acabar a prova. Ainda uma nova subida até que, perto dos 100 km, só via descidas. Estava em pânico. Do lado direito via a imponente ponte de Ronda iluminada. Por um lado sustinha a respiração ao admirar o encanto de toda a envolvente, mas por outro sentia o cansaço a dar sinal de si. “OK, isto é lindíssimo, mas como é que vou subir isto tudo?”. Faltavam poucos km’s mas serem só descidas e nunca mais aparecer a subida final deu cabo de mim. Para além disso estava com uns sintomas de azia horríveis, os quais devem ter sido provocados pelo excesso de isotónicos. O meu estômago parecia estar a cantarolar a música “we all stand together” do Paul Mccartney. Só lhe tentava explicar que faltavam 2 km’s para chegar à meta e se fosse preciso íamos contando os metros para ser mais divertido. Depois daquela interminável subida encontro a Carla que me veio buscar, nem queria acreditar. Abraçamo-nos de orgulho. Senti-me tão feliz que ao mesmo tempo nem sabia o que dizer, estava mesmo completamente atónita. Ainda corremos um pouco até à meta. Nem sei onde tinha forças. O meu cérebro estava completamente em modo automático e apenas a saber responder em binário (ou sim ou não!). Chegada à meta. Eram umas 5:30 da manhã e a meta cheia de pessoas. Não acreditei que as pessoas largassem as suas horas de sono para apoiar estes “loucos que correm”! Carimbaram-me o passaporte da prova e quando olho para o mostrador de quantas horas passaram, fico ali segundos a olhar. Não acreditava que tinha sido possível. Mesmo aturdida, naquele momento senti que tudo fazia sentido. Senti que o que consegui não dependeu só de mim, mas também de todos os que estiveram ao meu lado nos últimos tempos directa e indirectamente. Comecei a ter flashes dos dias de treino, trabalho, saídas com amigos… De repente comecei a juntar os fragmentos de motivação que todos os meus amigos e família me foram dando e até mesmo os de desconhecidos. Passa por mim a minha motivação principal. Sinto que esta foi no fundo uma mensagem na qual devo estar grata e orgulhosa no carinho e amizade de pessoas maravilhosas que tenho ao meu lado. Orgulho nos amigos que me acompanharam nesta odisseia. Orgulho na minha recente “Madrinha” (pois se tenho um Padrinho preciso de uma Madrinha!).
Orgulho na minha equipa e no meu “Padrinho” que sempre estiveram comigo. Senti um enorme orgulho em ter sido a primeira mulher Run4Fun “cientounera”!
Só me resta a agradecer a todos os meus amigos e família!
Obrigada a todos!
Data: maio 13, 2014
Há experiências que nos marcam.
Temos experiências que na altura achamos o máximo mas que depois desvanecem ao voltarmos à vida mundana. Depois temos experiências que indirectamente alteram toda a nossa forma de estar. Inadvertidamente invadem a nossa zona de conforto e fazem com que uma espécie de “upgrade” da mesma. O ter superado uma ultramaratona foi uma dessas experiências. Houve muito trabalho, muitas horas a treinar e lesões ou pseudo-lesões pelo meio. Houve muitas alturas que roguei pragas ao meu corpo por não me obedecer, houve alturas em que me fartei de chorar porque não seria desta que ultrapassava a barreira dos três dígitos e pior, houve alturas em que pensei mesmo desistir. A ideia de me inscrever nesta prova veio depois de muitos dos meus amigos e alguns colegas de equipa a terem feito. Mas após consultar a página e ter visto toda a sua abrangência, a inscrição tomava cada vez mais um carácter pessoal. Ora, o meu Avô foi militar e senti que fazia sentido dedicar-lhe algo tão imponente. Para além disso, a data em si é muito importante para mim… Dia 11 de Maio foi a data em que o meu Pai fez um transplante de fígado há 5 anos e felizmente está tudo a correr muito bem. Os 101 Km de Ronda passaram a ter um enorme significado. Já não era só a questão de ultrapassar os três dígitos mas poder dedicar algo majestoso a pessoas que foram e são importantes na minha vida. Foram meses com treinos alucinantes. Foram semanas em que tentava conciliar toda a minha vida desde a profissional à pessoal em torno deste sonho. Pelo meio fui conhecendo pessoas maravilhosas que me foram ajudando. Quer nos treinos, quer a ajudar-me psicologicamente para esta aventura. Desde os treinos com o grupo “Correr Lisboa”, aos treinos das quartas com a malta do ginásio, os treinos das quintas com a minha equipa laranjinha, os Run4Fun, e os longões de fim-de-semana com grupos variados. Toda a energia tornava o sonho possível. Às tantas o meu corpo resolveu pregar-me uma partida. Não sei o que tive, mas de repente comecei a ver o sonho a fugir. A sentir a perna como se me tivessem pegado nela e a tivessem colocado ao contrário mas que voltou ao estado normal. Tentava correr e não conseguia. A quase um mês dos 101 de Ronda e eu naquele estado. Não estava a acreditar. Tentava todos os meios alternativos para evitar que algum médico me impedisse de ir. Num treino nocturo anterior à prova voltei a acreditar. Foi lindo ter andado por Monsanto à noite percorrendo os seus trilhos. A vivência por ali tornou a longínqua Ronda possível de atingir. Estava quase e ia ser mesmo possível! Entretanto, e mesmo quase na véspera, num treino rotineiro senti as dores a voltarem. Não sei se era o nervosismo a apoderar-se de mim se o quê. Deixei os treinos de parte e foi descanso absoluto. Foram igualmente nimed’s e adalgur’s à espera que o mal desaparecesse. Só pedia a Deus, que se existisse, numa altura destas não me deixasse ficar mal. E chega o dia da partida para Ronda… Juntou-se um grupo magnífico! Acredito que melhor seria impossível, e acredito que se não fossem estas pessoas, a Carla, o Rui e o Orlando eu nunca teria vivido tão intensamente Ronda. O carácter pessoal começou a ganhar outra dimensão. A força e a energia pré-prova ganhavam mais peso. A dinâmica no levantamento dos dorsais, a palavra “cabrón” que fazia parte das nossas galhofas. A falta de água, pois no hotel em que supostamente o Rui ia ficar mandaram-lhe um mail no qual diziam que não o podiam receber por causa de problemas com a água. O almoço em que “ya no tenemos” quase que fazia parte do menu. A ida para a casa em que íamos estar no fim-de-semana (na qual ficamos deslumbrados com a paisagem e só questionávamos porque é que tínhamos de ir correr no dia a seguir)! A luta pela bandeira de Portugal (disputada entre a Carla e o Orlando) e a envolvência na “Fiesta Pasta”! Sentirmos que Ronda nos estava a acolher com toda a sua beleza. O dia da prova. O nervoso miudinho andava por ali feito bisbilhoteiro dando por vezes azo à excitação para a prova. Encontramos ainda mais grupos de portugueses. Foi lindo ver o companheirismo entre todos, e mágico encontrar ali no meio a grande inspiradora Analice Silva. Esta é uma das verdadeiras Senhoras (e propositadamente com S grande), é uma das pessoas que admiro mesmo e que me inspira. Sempre com um sorriso, sempre alegre, e quando conhecemos a sua história… Sim, ela é que tinha e tem os verdadeiros motivos para se estar a lamentar de tudo e todos… E não… Olha e encara tudo com um sorriso… E mais… Tem 70 anos e vai a estas provas encher-nos de orgulho pela pessoa que é. Confesso que a prova não podia ter começado da melhor forma. De um lado uma campeã e motivadora como a Carla, e do outro a Analice. O sonho quase a concretizar-se! Antes da partida gostei do ênfase com que proclamaram o mítico “Viva España! Viva el Rey! Viva La Legion!”. Tiro de partida. Percorrer parte da cidade com todos os habitantes na rua a dar ânimo a todos os participantes. É uma sensação única! Antes de passar a majestosa ponte sentia um esforço enorme a conter a emoção. Era tudo tão lindo que nos dava ânimo para as longas horas de prova. Estava um calor horroroso, deviam estar perto de “40º à sombra”. Nas vezes em que pensava que ia ter muito tempo para correr lembrava-me das palavras sábias do Rui, “É para ser tranquilo mas não para relaxar muito”. Em rectas e descidas (desde que não fossem muito inclinadas) dava na velocidade, o resto fazia tudo a andar. Evitava perder muito tempo nos abastecimentos e como levei comida preferia comer do que tinha. Às tantas, e antes dos 20 km a minha mochila resolve dar em pateta e fiquei com o fecho na mão. Entrei em pânico, a sorte é que me ajudaram e lá consegui seguir o meu caminho (daqui deu para concluir que em provas destas esqueçam o material dos supermercados…). Foi interessante ver o espírito empreendedor. Quase aos 30 km comecei a avistar barraquinhas a vender água e sumos frescos por 1€. Por acaso já nos tinham prevenido para levar moedas e antes de uma subida enorme foi bom ter bebido quase um litro de água fresquinha! Mais perto dos 60 km cheguei a Setenil e adorei a festa que fazem a receber os participantes. As ruas cheias de gente a gritar por nós. As esplanadas completamente à cunha. E foi interessantíssimo ver a admiração que as mulheres tinham por nós mulheres, cada vez que viam uma rapariga enchiam-se de orgulho e gritavam “Chica, campeona!” Ainda encontrei o José, que tinha conhecido na Maratona de Sevilha, que me foi dando conselhos úteis. Entre os 70 km e o quartel (que se encontrava aos 75.4 km) foi a pior parte da prova. Olhava para o relógio e não via os km’s passarem. Sentia que tinha descoberto o muro dos 100. Em provas de 10 km, aos 7 já estou farta e só quero que acabe, aos 21 essa sensação surge aos 17 e aos 42 km surge aos 35. Nesta prova, perto dos 70 km comecei a ver os camiões militares a transportar a malta que ia desistindo ou sentir-se mal. Até que gostava de experimentar andar numa coisa daquelas, mas não era caso para tanto. Também sentia as minhas mãos inchadas como tudo (talvez do calor ou pelo próprio ácido láctico). Se colocasse umas luvas brancas bem podia competir com o Pato Donald (não o Pato Ultramaratonista). Quando cheguei ao quartel só me apeteceu chorar ao encontrar o “Todo por la Patria”. Retive uns segundos e sorri “Esta é para ti Coronel!”. Ouvir a corneta e fazerem-nos continência foi qualquer coisa de indescritível. No quartel propriamente dito serviam mesmo um jantar. Dado que era tarde, seria bom não parar. Nesse sentido optei por trocar para os ténis de trail e comer apenas o essencial. Já me tinham avisado que a última parte seria pior e por isso pensei em despachar-me para não entrar em cansaço. Também me tinham dito que o quartel era o “cementerio” pois sentava-se para comer e depois não se levantava para terminar a prova. Aos 80 km começaram as subidas em trilhos, só me lembrava da máxima de que onde há uma subida há uma descida. Depois perto dos 90 km senti-me mesmo feliz por ainda conseguir correr. Sentir o vento na cara a dar-me ânimo para continuar. Num ponto alto olho para o telefone e vejo a mensagem da Carla a perguntar se estava no quartel. Não hesitei em ligar-lhe e dizer-lhe que estava quase na meta. Ganhei mais ânimo para acabar a prova. Ainda uma nova subida até que, perto dos 100 km, só via descidas. Estava em pânico. Do lado direito via a imponente ponte de Ronda iluminada. Por um lado sustinha a respiração ao admirar o encanto de toda a envolvente, mas por outro sentia o cansaço a dar sinal de si. “OK, isto é lindíssimo, mas como é que vou subir isto tudo?”. Faltavam poucos km’s mas serem só descidas e nunca mais aparecer a subida final deu cabo de mim. Para além disso estava com uns sintomas de azia horríveis, os quais devem ter sido provocados pelo excesso de isotónicos. O meu estômago parecia estar a cantarolar a música “we all stand together” do Paul Mccartney. Só lhe tentava explicar que faltavam 2 km’s para chegar à meta e se fosse preciso íamos contando os metros para ser mais divertido. Depois daquela interminável subida encontro a Carla que me veio buscar, nem queria acreditar. Abraçamo-nos de orgulho. Senti-me tão feliz que ao mesmo tempo nem sabia o que dizer, estava mesmo completamente atónita. Ainda corremos um pouco até à meta. Nem sei onde tinha forças. O meu cérebro estava completamente em modo automático e apenas a saber responder em binário (ou sim ou não!). Chegada à meta. Eram umas 5:30 da manhã e a meta cheia de pessoas. Não acreditei que as pessoas largassem as suas horas de sono para apoiar estes “loucos que correm”! Carimbaram-me o passaporte da prova e quando olho para o mostrador de quantas horas passaram, fico ali segundos a olhar. Não acreditava que tinha sido possível. Mesmo aturdida, naquele momento senti que tudo fazia sentido. Senti que o que consegui não dependeu só de mim, mas também de todos os que estiveram ao meu lado nos últimos tempos directa e indirectamente. Comecei a ter flashes dos dias de treino, trabalho, saídas com amigos… De repente comecei a juntar os fragmentos de motivação que todos os meus amigos e família me foram dando e até mesmo os de desconhecidos. Passa por mim a minha motivação principal. Sinto que esta foi no fundo uma mensagem na qual devo estar grata e orgulhosa no carinho e amizade de pessoas maravilhosas que tenho ao meu lado. Orgulho nos amigos que me acompanharam nesta odisseia. Orgulho na minha recente “Madrinha” (pois se tenho um Padrinho preciso de uma Madrinha!).
Orgulho na minha equipa e no meu “Padrinho” que sempre estiveram comigo. Senti um enorme orgulho em ter sido a primeira mulher Run4Fun “cientounera”!
Só me resta a agradecer a todos os meus amigos e família!
Obrigada a todos!
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