A homenagem que eu preferia não fazer

 O ano de 2021 começou bem, com um bom treino dos Heróis do Mar em 1 de janeiro e outro em 3 de janeiro. No dia 4 a Luisinha fez um teste covid-19 que deu positivo. Eu e os nossos filhos fomos fazer o teste: eu tive resultado positivo e os nossos filhos negativo. Ficámos confinados e deixei de treinar. Não tivemos problemas e passadas duas semanas voltamos a fazer a nossa vida. O meu irmão deu-nos grande apoio e ligava quase todos os dias a perguntar como estávamos. Depois do confinamento dizia-me para eu ir dar umas voltas, sair de casa.


Eu sempre tive uma boa relação com o meu irmão, tirando um período em que por causa de um desentendimento devido ao R4F, em que estivemos mais afastados. O que acabou e voltámos  há alguns anos á nossa boa relação. O Rui era o meu irmão mais velho e como tal sentia um certo dever de proteção ao irmão mais novo, o que eu sempre apreciei.

A 8 de fevereiro o Rui disse-me que tinha testado positivo para a covid-19 e ia ficar confinado em casa. Passados três dias sentiu-se pior, ligou ao SNS 24 e sugeriram-lhe que fosse ser examinado no Hospital de S. José. Ficou internado e no dia seguinte foi transferido para uma enfermaria do Curry Cabral. Passados três dias e tendo o seu estado piorado, foi transferido para a Unidade de Cuidados Intensivos, tendo falecido duas semanas depois. 

Era uma pessoa saudável, 63 anos,  Professor de Educação Física no ensino secundário, tinha cuidado com a alimentação, nunca esteve internado num Hospital, exceto na sequência de uma operação aos ligamentos de um joelho. 

Foi o maior desgosto da minha vida, superior ao que tive com a morte do meu pai, em 1998. Que tinha quase 91 anos e que esteve um ano e meio em casa, depois de alguns problemas vasculares. Não foi inesperado ao passo que a morte do Rui foi completamente inesperada, custou-me muito a aceitar.

Deixei de treinar, e só em junho passei a fazer um treino semanal, ao sábado. Comecei com 3 km e depois fui aumentando até chegar aos 7 km em julho. A Maratona do Porto sempre foi um desejo meu e estive varias vezes inscrito, mas por uma razão ou outra nunca a tinha feito. No final de 2019 inscrevi-me para a de 2020, que foi adiada para 2021.

Em Agosto deste ano lembrei-me de fazer a maratona do Porto em homenagem ao meu irmão, que a tinha corrido em 2013, a sua segunda maratona. Foi uma grande representação, 29 atletas R4F com várias estreias.

A partir daí comecei a treinar com maior intensidade. Descobri as "Gira" as bicicletas de Lisboa e onde antes ia de Metro, passei a ir de bicicleta. Em Setembro, depois das férias voltei ao ginásio, onde passei  a fazer aulas de RPM, Spinning e Cycling o que  fortaleceu muito a parte superior das pernas. E continuei a fazer caminhadas

Em setembro, no total dos treinos, caminhadas, ginásio fiz mais de 446 km, em 68 horas, mais do que o acumulado do ano, que tinha feito até aí. E em Outubro fiz 461 km, em 62 horas.

Fiz alguns treinos longos, o ultimo dos quais um treino de 19 km no domingo, 31 de outubro, na Expo,  com o Zé Magalhães, no domingo anterior os 25 km do Trilho da Costa Vicentina e em 17 de outubro, fiz 22 km na maratona de Lisboa com o Vasco Murta Rebelo.

Sentia-me preparado para fazer a Maratona do Porto. Fomos  na 6ª feira num autocarro da FlixBus, a UBER dos autocarros públicos. No sábado de manhã, passeámos no Porto e à tarde fui visitar, com o meu amigo Jorge Andrade, o Museu do FCP, clube de que sou adepto, desde sempre.

Fomos jantar com os amigos R4F a Matosinhos, uma excelente refeição, organizada pelo Gonçalo Melo. E como de costume, acordei cedo, no domingo, para fazer a Maratona.

O pequeno almoço no Hotel Tuela foi farto com bacon e ovos, fruta, leite, sumo de laranja, café e alguns bolos. E lá fomos com a Carla Rebelo, a conduzir, para a partida onde deveríamos estar frente ao Sea Life,  para a foto de grupo, às 8:30. Houve uns problemas logísticos (?) e só chegámos ao Sea Life por volta das 8:50. Seguimos para os currais e tirámos algumas fotos.


Lá estavam os meus "rebocadores" a Sandra Simões e o Jorge Paulo que se tinham oferecido para me acompanhar do princípio ao fim da prova. Bem como o Vasco Murta Rebelo que no seu passo certo, chegou ao fim da prova. Também o João Veiga que, em homenagem ao Rui, correu com uma camisola R4F que o Zé Magalhães lhe emprestou.

Começámos a prova em bom ritmo, a ideia era fazer entre 4,5 a 5 horas, mas no inicio, com o entusiasmo normal, fizémos alguns kms, a 6 minutos e pouco. Já em Leça, juntaram-se  a nós a Manela e o Pedro Machado, que nos acompanharam por mais de 15 km, até quase ao retorno ao Castelo do Queijo. Desde o primeiro km e em cada km, sempre que chegávamos à placa da distância, cantámos o hino do Pedro Machado É RUN é FUN, é RUN 4 FUN. Claro que quando o Pedro Machado, se juntou a nós, o nível de decibéis  do hino, aumentou significativamente.

E lá fomos, km a km, os meus amigos Sandra e Jorge sempre ao meu ritmo. A primeira meia correu bem, mas  a partir daí começaram as dificuldades. Tive que ir duas vezes à casa de banho e a partir dos 28 km comecei a ter que andar, de vez em quando.


Adotámos uma nova estratégia a partir dos 30 km que foi correr até ao final do indicador do km e depois andar uns dois ou três minutos. E a Sandra  e o Jorge com uma enorme paciência, a andarem sempre que eu andava e a correrem sempre que eu voltava a conseguir correr. E assim, km a km, lá fomos andando. Na Ribeira e depois do nosso incitamento, recebemos um enorme aplauso das pessoas, na sua maioria estrangeiras que estavam na esplanada.

A partir dos 32 km começamos a fazer a contagem decrescente, para nos irmos animando. 

Entretanto juntou-se  a nós um corredor, o Amaro Rocha, que ia ao nosso ritmo e que uma vez nos passava outras vezes nós o passávamos. Foi engraçado percebermos que ele estava  a competir connosco, pois no final, já perto da meta, olhava frequentemente para trás para ver onde íamos e quando acelerámos e nos aproximámos, ele quase fez um sprint, para ficar à nossa frente. No final fomos cumprimentá-lo.


O Rui Faria acompanhou-nos desde o km 40 e na meta tínhamos a Luisinha e a  Andreia à nossa espera. 

Concluímos os três ao mesmo tempo com a Sandrinha ao meio. Agradeço muito à Sandra e ao Jorge Paulo, o apoio e paciência que tiveram em me "rebocar" durante 42 km. Grandes amigos!!



É curioso que, se hoje temos a marca RUN 4 FUN o devemos à Sandra Simões, advogada, e ao Jorge Paulo, especialista em marcas e patentes, que organizaram e defenderam o nosso processo vitorioso  no INPI, contra uma equipa de Vizela que registou a marca, muito depois de nós a utilizarmos já há alguns anos.

Foi uma bela prova, no final pedimos uma cerveja preta, que a Sandra deu ao Rui e celebrámos a nossa conquista. 

Foi a minha sétima maratona de estrada, a sexta tinha sido em 2013, há mais de 8 anos. tenho 62 anos e um plano de maratonas para os próximos anos. Já estou inscrito para Sevilha 2022 e irei fazer Praga 2023. Sevilha, Porto e Praga foram as três maratonas que o meu irmão fez na sua vida. Esta a razão pela qual as vou fazer.

Concluirei em 2024, com a Maratona de Lisboa, que foi a primeira que fiz, em 2009.

Agradeço aos meus amigos e companheiros do RUN 4 FUN os incentivos que deles recebi para fazer a Maratona do Porto.

Runabraços e:  É RUN é FUN, é RUN 4 FUN













Comentários

  1. Muito obrigado João.

    Agradeço o texto e especialmente a partilha de emoções. Foram sem dúvida momentos muito sentidos não só por ti mas também por muitos de nós que conviveram com o Rui.

    Proponho-te que dinamizes no seio do R4F a nossa participação nas maratonas que selecionaste. Suspeito que tal como aconteceu na maratona do Porto, muito provavelmente terás também companhia.

    Um forte abraço.
    Teodoro Trindade

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  2. Muitos parabéns João. Justa homenagem ao teu irmão.
    Um abraço
    Miguel San-Payo

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  3. É como dizes. Era preferível não teres que fazer.
    Mas a vida é pula e avança. Não ficaste parado e fizeste a bonita homenagem ao Rui Ralha.
    Foi e será sempre bom homenagear aqueles que gostamos.

    Sempre te gostei de ver quando participava bos treinos dos Heróis do Mar e outros.
    Entretanto tiveste largo período com a tua amiga dor e treinavas muito pouco.

    Sempre pensei que um dia voltarias a treinar para um prova.

    Motivado e empenhado nos treinos... E cá está ela a Maratona, que é uma prova dura, feita com categoria. Valente!

    Vamos lá treinar para a próxima.

    Parabéns!!

    Runabraço

    Rui

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  4. Parabéns, João, pelo relato e pela maratona.
    É uma grande e dupla homenagem, em que deste e revelaste muito de ti!
    Um forte abraço,
    Jorge Duarte Pinheiro

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  5. João, as tuas homenagens têm sido constantes e incansáveis, o que demonstra bem o amor e carinho que tens pelo teu irmão. Esta implicou coragem e um esforço intenso. Sendo esta uma sociedade adversa à actividade física foi admirável assistir à tua decisão, aplicação e resistência, sabendo que estiveste muito tempo parado e desmotivado.

    Imagino o ar de orgulho do Rui, a assistir a tudo.

    Hoje vi um documentário que referia que o tempo é o bem mais escasso do planeta. Por isso mesmo, devemos aproveitá-lo ao máximo, em vida. Quando (inevitavel e realisticamente) esta termina, aproveitemos para a relembrar, homenagear e celebrar.

    Obrigada por nos permitires fazer parte desta homenagem: a corrida passa a ter um significado muito mais humano e importante.
    Beijinhos

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  6. Parabéns...ninguém queria fazer esta homenagem mas a verdade é que foi bonita.
    O espirito de grupo e de entreajuda que o Rui gostava continua lá.

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  7. Querido amigo,
    ainda não posso imaginar nem aceitar. Imagino que tudo e todos ficavam como eram. O Rui foi um homem sincero, passional, divertido, alegre - ainda é assim na memória. Tu e ele eram muito diferente e muito semelhante no mesmo tempo. Gostei e gosto de vos muito, vos admirei e admiro muito. Há que primeiramente aceitar a tristeza profunda e o lugar vazío, e tentar de fazer o melhor desta vida que fica. Um forte abraço...

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  8. Parabéns pela homenagem, João Ralha.
    O Rui certamente ficou orgulhoso.
    Fica o teu exemplo de resiliência e irmandade ao teu mano, que era um Senhor Atleta e um influenciador.
    Obrigado pela partilha e exemplo que ambos sempre deram.
    Um abraço de saudade.

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  9. Parabéns pela homenagem, João Ralha.
    O Rui certamente ficou orgulhoso.
    Fica o teu exemplo de resiliência e irmandade ao teu mano, queera um Senhor.
    Obrigado pela partilha e exemplo que ambos sempre deram.
    Um abraço de saudade.

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  10. Não conhecia o Rui, mas o João conheço desde o primeiro dia... está aqui tudo, é um ser humano incrível que todos temos ou já tivemos o privilégio de uma forma ou de outra ter privado com ele. De resto, a tristeza ficará para sempre mas a vida continua e eu prometo acompanhar-te sempre..Um abraço.

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  11. Meus queridos amigos, com muito atraso, venho agradecer-vos os vossos fraternos comentários de muita amizade, comigo e com o meu irmão. Mais vale tarde, que nunca.

    Farei sempre o possível para que o Rui seja lembrado, como a boa pessoa que era e meu grande e insubstituível amigo.

    Contrariamente ao que tinha planeado, não vou conseguir fazer a Maratona de Sevilha, este ano, porque a minha vida complicou-se no dealbar do ano e deixei de treinar, mais uma vez.

    Mas espero voltar em breve a treinar, para poder voltar ter o prazer da vossa companhia e desfrutar com os RUN 4 FUN e amigos.

    Runabraços

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