Oh Meu Deus! e ... Será que à 3ª é de vez?!

X EDIÇÃO / 11 A 13 DE JUNHO DE 2021

“Oh Meu Deus! Oh My God, Oh Mon Dieu, Oh Dio Mio, Oh Mein Gott, ああ、私の神。!

Esta interjeição universal significa incredulidade por algo que se lhe depare.”

Eu já me tinha “interjeitado”, anteriormente, e por duas vezes. Isto é… sobre a ideia de fazer a distância das 100 milhas. Aquela que equivale a 160km.

A primeira vez foi quando em 2019, juntamos uma grupeta de atletas. Fizemos a pré inscrição para ir a sorteio nas várias distâncias das provas do UTMB. Eu, já nem sei como foi, mas mandei-me para as 100 milhas. Oh Meu Deus!!
Infelizmente não fomos sorteados. Hoje digo que foi “infelizemente”, porque se calhar já tinha completado essa distância em vez de andar aqui de tentativa em tentativa e o raio do aquecimento global não me deixa terminar.

Mas vamos lá. Desde essa inscrição para o UTMB que o bichinho ficou cá dentro.

E, a bem da verdade, o primeiro passo nestas coisas não é quando o starter dá a partida. O verdadeiro primeiro passo é quando tu assumes que desejas fazer e aceitas os desafios. Este é o verdadeiro primeiro passo quando nos atiramos para fora de pé.

Meses depois de sabermos que ninguém ia ao UTMB, foi a meio de um treino, e numa conversa do beca beca com o Pedro Ribeiro que parece termos falamos sobre uma nova investida nessa distância. Se calhar estávamos imbuídos do espirito da parvoíce outra vez. Mas certamente deve ter havido interferências das ondas elétricas da central elétrica por perto. Ou isso ou fomos raptados por criaturas verdes. É que até hoje não me lembro da conversa. E o Ribeiro afirma que fui eu que puxei o assunto. Apesar de eu ter mensagem dele a mostrar o contrário. Foi ele que desafiou.
 
O facto é que pouco interessa quem desafiou quem. Vai não vai… e Pimbas!! Inscrito no Estrelaçor para a distância interjetiva... e até mais. Oh meu deus, 180km?!! Era o que havia de provas nesse ano.
Pergunto-me porquê?! Como qualquer ser humano, adaptei a opção que fiz, à necessidade que não existia e consegui encafufar uma porrada, e mais alguns, motivos num canto do cérebro. Justificações como “Ah, e tal é a última distância mítica que me falta fazer… há os 10km, a meia maratona, a maratona, os três dígitos (100km) e agora fecho com os as 100milhas.” Assim até parece bonito.

Entretanto vem o confinamento e a maior parte do treino teve que ser em estrada, estradões, flat, e as vezes alguma altimetria quando dava.

O plano de treino para uma prova destas requeria muitas horas e km de treino.

Ora… em estrada, para mim é complicado. Primeiro porque é de uma monotonia atroz. E segundo porque o meu esqueleto não gosta muito do impacto do alcatrão.
Consequência, tive um revés e tive que ficar 5 semanas sem treinar para diagnosticar um problema no joelho. Tudo se resolveu e adaptei o meu treino às circunstâncias.

Passei a usar os bastões em qualquer treino para me permitir continuar os treinos e ajudar a melhorar da mazela.

Vamos em frente… Já em plena prova do Estrelaçor e na companhia do Pedro Ribeiro. Fizemos a prova sempre juntos. Duo Trote Mira, invetivo o Pedro. Foi assim que nos apelidou pelo fato de, excetuando as subidas, colocamos sempre um trote calmo e sem magoar.

A prova estava a correr muito bem, e estávamos com 140km de prova quando chegamos ao Alvoco da Serra.
Ao entrarmos na Vila, tivemos o pré-aviso do que ia suceder a seguir. Uma senhora que passava na calçada junto a igreja dizia qualquer coisa como… “vão subir a serra?! Aquilo está mau” Eu respondi “Não há problema, nós temos o relógio que nos indica o percurso”. A senhora retorquiu “há muitas pessoas experientes que se aventuram nessas condições e depois ficam lá”. Depreendi que o ficarem lá não era morte, mas sim terem que ser resgatados.

OH MEU DEUS!! Ao chegar ao recinto da escola primária, que era entrada da base de vida da prova nesse nos 140 km, somos logo confrontados com a informação que a prova estava suspensa.

Suspensa até nova indicação e que a retoma iria ser avaliada se as condições de nevoeiro melhorassem.

As condições climatéricas em vez de melhorarem, só pioraram. Com isto, o nevoeiro e a serra engoliram alguns atletas e estes tiveram que ser resgatados das suas garras. Com hipotermia não vale. E… a prova foi definitivamente cancelada.

A malta fica com um sentimento meio esquisito. Todos para casa e as 100 milhas ainda não foram desta vez também.

E prontes. Mas a história continua e… Bom!! Já que estou com o treino vou procurar uma prova para cumprir o que ainda não foi feito.

Foi então que entre as provas TPG 165km e OH Meu Deus 100 milhas, escolhi inscrever-me na segunda. E apesar de achar que o TPG seria uma prova gira em termos de paisagem e até mais simpática para os pés e pernas em termos de piso, só tinha 4 abastecimentos durante 165km. Achei muito pouco. O preço da prova também era superior ao Oh Meu Deus e além não estava associada ao ITRA.

Ok. Vou então para o “OH meu Deus” que é na Serra da Estrela que eu bem conheço.

O Oh Meu Deus é uma prova mítica em Portugal. Foi a primeira, por cá, a ter a distância das 100 milhas.

Estava decido e feita também a inscrição. Depois foi uma aventura de treinamento. Muito me ajudou ver os atletas do Clube a fazerem os jogos do Strava.

Nos jogos que não participei acompanhava a Sandra e outros atletas e ao mesmo tempo treinava.

Nunca treinei tanto desde que sou laranjinha (2013). Mas é tão bom sentir a evolução da resistência dos músculos e a progressão do treino.
O que não é bom é ouvir dizer para abrandar e para descansar… . Eu farto-me de “bater nesta tecla “ e obviamente vou continuar a pensar assim.

Quando se está a treinar é porque se está a treinar. E é claro que devemos seguir algumas regras. Eu sou das pessoas que costumo ler e seguir regras de treinamento. Também costumo seguir algumas coisas básicas da suplementação quando se está em fase de treinos. Por exemplo, tomo vitaminas, magnésio, barritas com proteína, etc.. mesmo nos treinos.

Pois, apesar de serem treinos, convém fornecer ao corpo os nutrientes necessários para poder trabalhar em condições justas.

Do meu corpo e nos exemplos de quem percebe da poda, vou buscar conhecimento empírico, na literatura disponível e nos estudos científicos vou buscar o conhecimento científico (quer ele esteja enviesado ou não) e no filosófico sou eu que invento e de vez em quando oiço também alguns artistas.

Mas as vezes ouvir comentários filosóficos de pessoas que nunca seguiram um plano de treinos, nem tão pouco sabem a importância de fornecer sais minerais ao organismo, deixa-me nervoso.

Em termos básicos o meu treino em 16 semanas foram 1511 km em 73 treinos. Este foi um plano de treinos que o Nuno Dias de Almeida me conseguiu arranjar. Ainda tentei procurar ajuda para um mais longo mas não encontrei nada. Mas este tinha que servir, porque já o tinha feito a 70% por duas vezes para provas de 100km e correu bem

Para completar o treino, nas últimas 3 semanas, resolvi fazer provas. Fiz o Torres Running Challange 32km; Demo Trail 50km; Ultra Trail Sicó 57km.
Fazer algumas provas, em modo de teste, deve ser das melhoras opções que se pode fazer. Se estivermos bem. Deu-me muita confiança. Independentemente de como tenham corrido os treinos, estas provas é que deram a o aval e a confiança final que precisei.

Na semana que antecedeu a prova, recarreguei o organismo com as vitaminas, os sais minerais e o carboloading. É meter os depósitos todos em modo FULL. Não me vou alargar sobre isso porque atleta que é atleta é o que admite só come massa, batata, arroz e muitos verdes para ir buscar o ferro que precisa.

Nos dias antes da prova, posso dizer que nunca fiquei muito excitado nem nervoso a pensar na prova. Estava normal e calmo. Talvez apreensivo com a condição do meu joelho. Que sinceramente estava ok, mas é preciso ir ganhando confiança.

Ao invés de estar a nora, o que fiz, foi um estudo aprofundado do percurso. Coisa de atleta parvo.

Praticamente fiz a prova toda, a ver o percurso com vista de cima num programa 3D. Isso permitiu-me ver que os primeiros 34km e até a primeira base de vida, podia levar uns ténis de estrada. Os ténis de estrada que tenho são mais leves. E assim também permitia-me levar os La Sportiva Akasha num troço mais necessário.

Momentos antes da partida, já estava com alguma excitação e desejoso de meter os pés no trilho. Encontrei-me com o João Menezes antes da partida deu para ver que ele não estava muito confiante. Este rapaz não existe.
A Sandra, o Gonçalo e a Cândida estavam lá na partida a dar apoio. É muito bom ter amigos por perto antes de cada aventura.

Estava também um outro amigo. O Jorge Sousa, que também ia fazer a prova. Iriamos fazer parte da prova juntos se desse.

A prova estava quase a começar. O discurso pré-prova do organizador foi muito motivador. Senti que era o dia de concretizar as 100 milhas. Por mim e pelos amigos que torciam por mim. E claro pela Maluquete.
O Som da música subiu e começa o circo. Saí nos últimos lugares da fila. Absorvi toda energia e vibração que consegui daquelas pessoas que estavam ali presentes a aplaudir e incentivar.

Carrega Faria!!

Na verdade não dava para carregar muito. Seguíamos o pace car. E depois ao fim de 3km, apareceram umas escadinhas e o pessoal fez fila. Nunca percebi esta patacoada da malta que arranca na frente e depois na primeira subidinha, escadinha, descidinha, ou outra “inha” qualquer parece que perdem a força. É deveras muito estranho e parvo.
 

Abriu o primeiro estradão e comecei a minha prova. O Jorge Sousa ia comigo. Acompanhava bem nas descidas e no flat. Nas subidas, e em power walking, o cardio do rapaz disparava e ela abrandava.

A partir de certa altura, acabei por ficar sozinho. A estratégia foi sempre a mesma. Sempre que o caminho fosse a direito ou a descer era para correr a trote. Nas subidas conseguia imprimir um ritmo bastante forte. Desde o minuto zero que usei sempre os bastões. São os meus amigos e ajudaram-me a conseguir treinar e recuperar o treino.

A meio da prova e quando podia, telefonava a Sandra para dois dedos de conversa.

Aos 34km foi a base de vida. Eu precisava trocar de mochila. Tinha deixado uma mochila praticamente toda preparada. Mas para além da mochila, era trocar de roupa e tênis. E comer claro.

Tinha uma folha escrita com o que devia fazer em cada base de vida. A logística ficou bem mais fácil. Lá está, o conhecimento empírico do Estrelçor.

Esta primeira parte da prova foi como previ. Estradões D+ relativo com subidas já a desafiar.

Cheguei forte e cheio de alegria à esta base de vida. Demorei o meu tempo, comi bem e saí animado.

De volta a prova. Nos primeiros metros uns atletas à minha frente iam na conversa e a andar. Vamos lá embora que se faz tarde amigos. E lá vou eu… De Vide até ao Sobral de São Miguel foi uma tareia descumunal. Felizmente para mim eram subidas à minha medida e estava a espera delas. Mesmo assim este troço conseguiu surpreender-me em grande. Que “puta” de desafio.

Esta prova é feita de troços com subidas únicas que acumulam bastante D+ por si só. O próximo troço que ia até o Alvoco era dos que menos D+ tinha, mas tinha uma das descidas mais manhosas da prova até então. Pedra solta e espaçada. Depois de fazer a subida fui por ali a trote na descida. Tira-nos o fôlego pelo fato de estarmos km sem poder descontrair um pouco o olhar e os músculos.

Finalmente, cheguei a Teixeira de Cima. Não era abastecimento mas acabou a descida. Acho que cometi um erro. Para ser simpático com um senhor, um agricultor, que na sua boa vontade estava ali a oferecer queijo, presunto e pão aos atletas.

Eu aceitei um pouco de queijo e segui. Comi metade. Segui em direção ao Alvoco. Este pedaço de troço era da caca. Eram 12km maioritariamente em single tracks e algum estradão. Descontraí um pouco do esforça da descida e comecei a trotar o trilho.

Começo a sentir o estomago a refilar e querer mandar alguma coisa cá para fora. Oh diabo!! Não gosto nada dessa sensação. A pior vez em que a tive foi nos 100km de Mérida. É mau.
No alto da minha sabedoria e do tal conhecimento empírico do meu organismo decidi que a melhor forma de tentar acabar com isso seria ir rolando muito lento no 10km até ao Alvoco e quando chegasse lá estaria recomposto. Era essa a ideia.
Passaram por mim alguns atletas e a vontade de ir atrás deles era constante. Mas resisti. Entretanto a pilha do frontal dá sinal e resolvo fazer a troca. Permiti-me mais um minuto de repouso.

O troço demorou mais do que eu queria. Mas foi bom porque fiquei quase bom do estomago. Como levava muita folga e tinha ficado com sono achei que podia descansar e fechar os olhos uns 20 minutos. Mas era impossível. Então resolvi tratar dos pés. Depois comi meia sopa, meia cola e meio café. Não era suficiente para toda a etapa seguinte. Mas foi o possível. Tinha barritas comigo. As barritas são dos melhores alimentos que podemos comer em prova. Aportam muitos dos ingredientes que necessitamos e não precisamos de anfardar grandes quantidade de comida.

O próximo caminho era uma subida daquelas filhas da mãe. Fiz a subida lentamente. Nesta subida estava um vento bastante forte que, ora nos empurrava para trás ora para o lado e algumas vezes para cima. Aqui passaram por mim 5 ou 6 atletas, incluindo as 3 primeiras mulheres em prova.
Antes do topo da subida estava bem melhor e voltei à prova. Colei-me aos 3 atletas que me tinham passado ainda a meio da subida e fomos os 4 a travar conhecimento. Terminou a subida e poderei voltar ao trote, mas era uma descida igual ou pior que a outra. Mantive-me no beca beca e ganhei novos amigos. Eram dois rapazes e a Isabel Moleiro. Quase a chegar à base de vida choveu um bocado e tivemos que colocar o corta vento.
Ao chegar a base de vida de Cortes do Meio, o calor tinha voltado e ainda fomos os 4 dar um mergulho da gélida água do rio.

Os dois novos amigos vieram avisar que iam andando e que já os apanhávamos mais a frente. Saíram da base de vida e eu e a Isabel saímos uns minutos depois. Por erro meu, eu e a Isabel saímos do trilho por uma subida que afinal não era. Perdemos algum tempo e perdemos a hipótese de voltar a trilhar com os dois “jovens” outra vez.

Por esta altura estava um calor infernal numa subida que começa a mostrar as garras. Não haviam sombras. Eram pedras e alguns arbustos e arvores muito de vez em quando. O sol estava a pique.

Não sei se foi pelo excesso de calor e esforço, mas a Isabel, ficou mal disposta. Vomitava bastante, mas só líquidos. Propôs que continuássemos lentamente e que quando encontrássemos sombras, parar, descansar e deixar o corpo arrefecer um pouco. E foi assim que fizemos até ao topo daquela monstruosa subida.

Não sei como a Isabel Moleiro aguentou continuar o caminho naquela condição dela. Mas é resiliente. Não é por acaso que já fez as provas mais longas que há em Portugal.

Este percurso também ficou marcado pela falta de marcações. Do pior que alguma vez apanhei no trail. Não é possível dar uma ideia. Mas imaginem que vão para um local onde não existe nenhum trilho nem terra pisada nem têm noção de qual a direção a seguir. Apesar de termos o GPX no relógio, desconfiávamos para onde ele nos estava a indicar o caminho. Simplesmente porque por onde o GPX indicava não existia nada nem espécie de caminho. Tinhamos que para e ficar a olhar a volta à procura do próximo ponto de referência. Quem marcou, marcou mal.
Marcou mal de tal forma que a organização já fez um mea culpa e devido a essa situação e ofereceu metade da inscrição aos atletas que não puderam terminar a prova.

Já lá no topo, no Alto da Pedrice a 1760m de altitude, eu e a Isabel a quase 10 minutos a tentar decidir qual era o caminho a seguir, juntaram-se mais 4 ou 5 atletas a nós. Estávamos todos a procurar o caminho por entre mariolas ou a tentar avistar alguma fita. Alguém encontrou o caminho e lá voltamos ao percurso. Estava a começar a anoitecer e lá longe numa outra serra qualquer avistam-mos uma espécie de tempestade com raios e tudo.

A alguns minutos atrás a temperatura estava alta mas agora caiu um pouco. E como íamos ficar sem sol, e íamos iniciar a subida à torre mais a frente, resolvemos colocar vestir o corta-vento e colocar o frontal. Coloquei também os maguitos que trazia apesar de achar que teria que os baixar.

Começamos a descer um estradão e a chuva chegou. Oh diabo!! Olhei para cima e só vi algumas nuvens. “Isto passa já”.

Acho que quando acabei de pensar isto a chuva aumentou e o ceu ficou negro. Veio o frio e os pingos de chuva eram enormes e gelados. Jesuss!! Consegui manter-me calmo durante uns 3 minutos. Já não dava mais. Ao sentir o corpo a gelar e a olhar para o corta vento todo molhado em apenas alguns minutos, achei que se não fizesse nada alguma coisa ia correr mal. Pior ficou quando estava literalmente a sentir-me incapacitado para tirar o telemóvel do bolso para ligar à organização.
Resolvi atirar-me para junto uma pequena formação rochosa, sacar o telemóvel do bolso da mochila e liguei a Sandra a dizer a ela onde estava e para ela ligar à organização. Pois eu não tinha equipamento para enfrentar aquele frio.

Resolvi virar-me para trás e avisar a Isabel que ia começar a correr para aquecer. Nem sei bem se lhe consegui transmitir alguma palavra. Isto foi o que a minha cabeça achou que disse.

Comecei a correr desalmadamente. Entretanto não larguei mais o telemóvel da mão. A Sandra liga-me de volta a dizer que a organização não atende e que eu devia acionar o botão de emergência do tracker que a organização nos forneceu.

Eu tinha ouvido com atenção a explicação da organização sobre os botões do aparelho. Como tinha o aparelho num bolso sozinho, consegui apertar através da mochila o dito botão. Aquilo tremeu várias vezes e foi assim que soube que tinha acionado os meios de ajuda dos Bombeiros e da Proteção Civil.

Corri mais algumas centenas de metros e avistei lá em baixo no cruzamento da estrada luzes de dois carros e luzes de um edifício.

Não sabia o que era aquele edifício. O meu pensamento era só os carros. Tenho que chegar lá para me ajudarem. Apesar de estar a correr com alguma velocidade, sinto o corpo todo gelado e sinto alguma falta de descoordenação entre os pensamentos e o ato de correr e o que ia fazer.

É qualquer coisa como um apito na cabeça que só tem um único som e uma única palavra “sobrevivência”. O resto é conversa.

Ao chegar junto aos carros, um dos rapazes veio ao meu encontro a mandar-me sair do trilho porque a prova tinha sido cancelada. E eu lá queria saber da prova!! Entretanto os rapazes dos carros deram-me abrigo entre as portas dos dois carros.  Liguei de novo à Sandra a dizer que estava com pessoas. Eu estava abrigado lateralmente mas a chuva e o frio vinham por cima. Qual filme de terror. A Sandruka manda-me colocar a manta térmica. Tal era a confusão na minha cabeça que nem sabia o que era a manta térmica. “AH!! A manta térmica. Tenho comigo sim…”
Tiro a mochila e manta térmica e nesse momento vem um outro atleta dizer que temos autorização para ir para dentro do hangar do centro de limpa neve. Que grande alívio.

Já lá dentro, tirei a roupa toda de cima e embrulhei-me na manta térmica. Ainda tremia mas a manta térmica começa logo a aquecer o corpo.
Passado algum tempo já quase não tremia. Tinha era que estar quietinho para o calor não fugir de mim.
Quando a ambulância dos bombeiros chegou (penso que demoraram uns 45 minutos) eu já estava tranquilo. Com frio, todo molhado, mas tranquilo.

Os outros 4 atletas, incluindo a Isabel Moleiro, também estavam ali. Todos de manta térmica também.

Apesar de ter dito aos bombeiros de socorro que só precisava de uma manta ou alguma coisa para colocar por cima de mim porque estava bem, eles obrigaram-me a ir para dentro da ambulância e fazer o diagnóstico.

Voltei para a meta de ambulância e a O Oh Meu Deus ficou por alí. Vai-se lá perceber isto.

“””””” Escrevi este texto a uns dias atrás e enquanto escrevia, recebo um alerta/informação da prova Estrelaçor a dizer que há preços promocionais até ao fim de Junho. TIC TAC…  a cabeça já esta a roda outra vez. Será que vou bater com os costados na subida à Torre da Serra da Estrela outra vez?!” “””””

Hoje dia 29.6 paguei a inscrição para o Estrelaçor em Outubro. Adivinhem lá?! 180km.

Acabo como comecei. Pela terceira vez este foi o primeiro passo da próxima interjeição.

Oh Meu Deus! Digam lá se o gajo é parvo ou não é?!