ALUT – A Palavra

Quando o Teodoro me falou numa prova no Algarve que o atravessava desde Alcoutim a Sagres, a ideia agradou-me. Tratava-se de um desafio interessante e gosto disso. Seriam 300 km para concluir em 72 horas e cada um fazia metade.




Inscrição feita.
Este ano tem sido difícil por vários motivos e claro a preparação não foi a ideal, mas estava combinado.
Palavra dada.

No dia 28 de Novembro fomos os 4 para o Algarve: Elsa, Guida, Teodoro e eu. Passámos a noite em Alcoutim e no dia seguinte tratámos dos sacos para as bases vida, que são os locais onde a organização tem para além de comida e bebida, camas e chuveiros. As horas passaram rapidamente e de repente estava a equipar-me para a prova.




Confesso que estava algo inquieto e sentia as pulsações a subirem. E de repente são 16h30, é dada a partida e começam 60 pessoas a correr sendo que a maior parte ia fazer os 300 km.
A primeira etapa com 38 km ligava Alcoutim a Furnazinhas e apesar de ser praticamente toda em estradões deixou-me preocupado pela quantidade de pedra solta e pequena que tinha. Não estava à espera disso e tinha levado as sapatilhas de estrada que são mais confortáveis e com maior amortecimento. A meio da etapa já sentia um incómodo nos pés.
Por volta das 21h45 quando cheguei a Furnazinhas tive que pôr creme nos pés e massajar para aliviar. Arranquei 30 minutos depois para a etapa que iria acabar em Cachopo. Seriam mais 35 km.
Ia pensando no meu pai e no dia do seu aniversário. Fui entretido a relembrar episódios e conversas e isso ajudou-me.

E agora num aparte, sempre que via numa lápide “Eterna Saudade” não percebia bem o que aquilo queria dizer e até me parecia um clichê. Até ao dia em que o meu pai partiu. Agora sinto isso.
Voltando à prova, o piso mantinha-se com muita pedra solta e para ajudar com alguns ribeiros onde inevitavelmente se molhavam os pés. Por volta das 23h00 choveu um bocado e originou alguma lama e não se conseguia ver bem onde se colocavam os pés.
Por volta das 3h00 acompanhado de um francês, perdemos-nos e de repente estávamos no meio de um matagal! Foram mais de 5 km ás voltas para encontrar o caminho correto que estava perto.
Sei que estas coisas acontecem, mas desanimam-me bastante e foi uma chegada a Cachopo penosa. Eram quase 5h30 e estavam feitos quase 80 km em vez dos 74 programados.
Nas bases o tempo passa muito depressa. Comi uma sopa quente, troquei a camisola, o buff, pilhas do frontal e de repente tinham passado quase 40 minutos! Fiz-me à estrada sem mais demoras que esta terceira etapa era a mais difícil.

A terceira etapa liga Cachopo a Barranco e é um autêntico carrossel. É um verdadeiro parte pernas de 29 km. Os pés cada vez doíam mais e estava a meio do percurso.
Cheguei a Barranco quase ao meio dia. Vi alguns a tomarem banho e também aproveitei para me refrescar e novamente por creme nos pés e massajar. Saí quase uma hora depois.
Esta quarta etapa era de apenas 25 km e era fácil, mas os meus pés estavam cheios de bolhas, algumas tinham rebentado e estava muito complicado de continuar muitos mais km.
Tive que parar várias vezes para aliviar um pouco as dores e seguir. Em Salir tive que telefonar ao Teodoro e pedir para ele antecipar a sua entrada de Messines para Benafim.
Custou-me muito fazer este telefonema. Estava combinado eu ir até Messines. Tinha dado a minha palavra. E no dia do aniversário do meu pai, mais do que nunca eu tinha que honrar a palavra. Sei da importância que isso tinha para o meu pai.



O Teodoro conhece-me bem. Disse logo que sim e quando eu cheguei a Benafim deu-me um abraço. Não eram precisas palavras.
Eram quase 18h30 e estava com 26h00 de prova e 133 km embora mais 7 km do que o estabelecido.
O Teodoro arrancou e fui descansar e cuidar dos pés. No dia seguinte eu e a Guida fomos esperar o Teodoro a Monchique e depois a Marmelete onde se juntou a família Trindade. Foi um momento bonito.
Estas são etapas duras com as maiores subidas: Picota e Fóia.
O Teodoro saiu de Marmelete por volta das 15h00 e esperava-o uma etapa de 36 km que iria acabar de noite. Na segunda noite.

Combinei com ele que iríamos trocar em Barão de S.João e eu faria a etapa até Vila do Bispo com 23 km. Dessa forma ele descansaria um pouco e eu cumpriria a minha parte e fazer os 150 km.
Tinha dado a minha palavra e iria cumprir.
E em S.João por volta das 23h00 trocámos. Não sei se conhecem esta zona mas tem muito pessoal com um estilo de vida diferente por assim dizer e quando estava no meio da Mata do Carrasco, admito que me senti desconfortável por ouvir tambores e tudo completamente ás escuras. Havia várias pessoas a tocar e nem uma única luz!
Entretanto apareceu um corredor que se tinha perdido e que quando viu a minha luz veio ter comigo e fomos juntos até Vila do Bispo.
Nessa última base passei o testemunho ao Teodoro, que na realidade era um localizador GPS e fui tomar banho e seguir para Sagres para o esperar.
Foi com muito cansaço e dores mas com uma enorme satisfação que o vi chegar por volta das 5h00 de domingo. Para além de mim, estava também a Guida, Elsa e a irmã do Teodoro, a Fátima.
Desafio superado! As dores passam mas fica a recordação de mais uma aventura.

Quero agradecer a todos que foram acompanhando estas 60 horas e foram dando uma enorme força com os vossos comentários. Acreditem que quando a pessoa está cansada, algo desanimado e preocupado e pega no telemóvel e sente tanto apoio, isso dá um novo animo e força e nisso os amigos RUN 4 FUN são incríveis!

Por último tenho que deixar uma palavra à Guida e Elsa. Foram fundamentais.




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