Os 12 Magníficos Concorrentes
No âmbito do projecto editorial R4F em curso, foi lançado ao longo do mês de Março um concurso de textos sob o tema:
"O que significa, para mim, correr?"
Pretendia-se desta forma seleccionar o conteúdo da contra-capa do livro R4F a editar brevemente. Ao todo tivemos 12 concorrentes. Os textos apresentados a concurso são transcritos seguidamente pela sua ordem de submissão.
"A felicidade não tem valor evolutivo. O que procuramos é a transcendência. E o que procuramos transcender é a nossa finitude, a nossa fragilidade, o nosso medo profundo. Vivemos aterrados. Perdidos num universo que não compreendemos, no qual não encontramos lugar nem propósito para as nossas curtas existências. É o terror do vazio que nos empurra para a frente. Não avançamos à procura da felicidade. Fugimos do vácuo.
Não experienciamos de forma absoluta o momento presente, mas vivemos antes imersos num contínuo que nos mergulha no passado e nos projeta no futuro. O lobo é mais um ser do presente, o qual vive de forma completa e inteira. Essa imersão no tempo leva-nos muitas vezes a esquecer o valor do processo e focamo-nos apenas no objetivo, que está sempre diferido. No próprio instante em que o cumprimos, esgota-se.
O lobo vive o processo. E os processos mais vitais são os mais viscerais, aqueles que envolvem a maior dose de êxtase, ligada inextricavelmente com extremos de agonia e desconforto. Por exemplo, quando corremos e damos o nosso máximo, durante um período prolongado de esforço ininterrupto e esgotante, o que é que sentimos? Sobretudo desconforto, mas também uma enorme exaltação. E sentimos isso tudo em simultâneo. São duas faces da mesma moeda que não são separáveis, experienciadas em uníssono. O que é que fica depois de acabarmos? O principal não é com certeza a marca atingida, mas antes a memória indelével e física do processo de correr. A corrida permite-nos, mesmo que seja apenas por breves instantes, escapar da condição humana." (Luis Matos Ferreira)
"Ato de coragem de enfrentar o desafio de cada passo, de percorrer o caminho da vida com determinação, com consciência de que os obstáculos se ultrapassam com esforço e sem desistir perante as adversidades.
A correr aprendi que tenho capacidades que apenas me eram desconhecidas, porque ainda não tinham sido colocadas à prova! E é tão bom desafiar-me e conhecê-las!
Aprendi a acreditar que está nas minhas mãos a possibilidade de me preparar para superar os desafios da vida. Aprendi a confiar em mim própria!
A correr aprendi a relativizar, a desdramatizar e a descomplicar. Aprendi a apreciar os momentos mais simples e belos, e a sorrir mesmo quando em esforço continuo a percorrer o caminho que escolhi construir. E como sabe tão bem apreciar a beleza do caminho, deixando de ficar ansiosa pela meta!
A correr aprendi a superar-me a cada dia, ouvindo o meu corpo e gerindo o esforço à medida do que sinto e dos sinais que vou recebendo. A correr aprendi que consigo chegar lá!
A correr encontrei a fonte de inspiração e de energia que preciso para me lançar sem medo ao desafio que é a vida! Encontrei a terapia perfeita!
As pequenas e consecutivas vitórias pessoais alcançadas na corrida, transformam-se em gloriosas conquistas que me enchem de prazer. E hoje sou mais feliz porque a correr aprendi a voar!
Sou muito grata a todas as mãos amigas que me incentivam, me inspiram, me acolhem e me guiam na fantástica experiência das corridas!" (Luisa Henriques)
"Corro porque é fundamental para o meu equilíbrio físico, mental e emocional. Porque me ajuda a lidar com “tudo o resto” e a ser mais feliz.
E sou mais forte porque os R4F são uma fonte de exemplos de coragem, amizade, persistência e humildade e fazem com que eu queira ser uma pessoa melhor. " (António Cruz)
"Iniciei a corrida por uma daquelas motivações tão recorrentes como ilusórias: a da saúde, da forma física; da estética. Não sei de que forma a corrida terá servido esse objectivo mas a eles estou grata por porque por causa deles soube da Bolha.
É um segredo que só alguns sabem, e que não partilham, para não retirar o prazer da descoberta aos que se iniciam na corrida, mas circulam à superfície do mundo bolhas espaciais onde podemos repousar em absoluta harmonia. A dificuldade está em nos aproximarmos delas de tal forma que nela podemos entrar sem que se rompam nem dispersem. Como podem entender há então que procurar, e procurar muito; poucas bolhas haverá que connosco casem na perfeição em espaço, em dimensão, em ritmo. Há que entrar na bolha sem romper a sua frágil membrana ajustando todo o nosso pulsar em perfeita sincronia com o da bolha e há ainda que nos despirmos de angustias, de medos, de ambições, para que o nosso estado de espirito possa alimentar essa harmonia. E há que mantermos esta paz e este pulsar o maior tempo possível para que a bolha nos carregue, física e espiritualmente, levitando sobre o mundo.
É então a bolha que me faz sempre voltar à rua, ao trilho e se encontrá-la não é garantido. Garantido é encontrarmos companheiros que o são, pelo simples facto de connosco partilharem este grande segredo.
Shiuuuu…!" (Cláudia Pargana)
"Com a chuva e vento
O medo a não existir
Só o corpo ao relento
Ao frio gélido resistir
As flores a nascer
A alegria a respirar
Já há resplandecer
Em nova cor no ar
Na praia a desistir?
Só energia a receber
O sol a nos transmitir
Saímos um novo ser
Altura das folhas a cair
Época de um renascer
Árvores a dançar e reluzir
É isto que me faz correr"
(Filipa Ferro)
"Quando oiço falar em corrida, penso em muitos adjetivos e sensações, mas talvez a que mais se destaca seja superação. Algum tempo depois de começar a correr a maratona, aqui na nossa vizinha Espanha, ouvia-se frequentemente à beira da estrada a expressão “si se puede”. Na altura não ligava, mas agora, refletindo um pouco sobre isso, essas palavras fazem todo o sentido.
Nunca fui um grande desportista, fiz aquelas coisas que todos os pais têm a preocupação de proporcionar aos filhos nos primeiros anos, a ginástica, a natação, e outras, mas na escola, no desporto escolar comecei a regredir para o zero e infelizmente para mim, aí me mantive até à idade adulta. Nunca fui excessivamente gordo, mas em determinada altura julguei que fazia algum sentido melhorar a minha condição física. Comecei pelos ginásios e assim andei uns anos, embora resultados nem vê-los.
No entanto tinha duas coisas menos más, sempre me levantei cedo e gostava de caminhar. Comecei então a caminhar, cada vez mais e cada vez mais longe, dai para a corrida foi um salto. Desci dos 83 para os 70 quilos, a balança lá de casa foi o meu primeiro motivador, mudei de cara, de hábitos, de roupa e continuei a correr. Juntei-me então ao grupo de corrida que todos conhecem e os progressos foram imediatos, outros treinos, mais provas e novos desafios. Comecei então a conjugar vários verbos até aqui pouco utilizados, como o tentar, o fazer, o conseguir, o acabar, o resistir e claro está, o superar.
Muitas vezes digo na brincadeira, a corrida é a minha farmácia e destes medicamentos espero ainda poder consumir muitos pela vida fora." (Fernando Rosete)
"Correr,
Não, não é nenhuma forma elaborada de esquecer seja o que for. Não é fazendo Kms que penso no dia de amanhã, nos problemas ou nas insónias da véspera. Não é pisando alcatrão que preparo a reunião do dia. Não é subindo montanhas que imagino como será o Céu quando lá chegar.
Mas, se calhar também é tudo isso .
Correr é paixão é Amor é loucura, é diversão é convívio é descoberta, é uma enorme satisfação.
Não sou, dos que tentam superar-se , sou mais do que correm pelo suor, pelo bronzeado do sol, pelo peso da barriga.....
Bem lá no fundo eu corro, para comer" (Filipe Corte-Real)
"Se as pessoas não corressem e eu fosse o único corredor. Apelidavam-me logo de maluquinho.
Se me conheço, continuaria a correr na mesma. E apesar de poder ser feliz assim, não seria a mesma coisa que correr acompanhado. Como eu gosto. Ainda bem que existem tantos maluquinhos a correr. E os piores são do meu grupo RUN 4 FUN.
Já se eu tivesse asas e voasse seria uma pessoa excecional e me pediriam autógrafos.
Provavelmente nunca seria tão feliz como a correr. Porque eu gosto mesmo é de correr por esses montes e sentir a natureza. Eu gosto de correr uma maratona e sentir o que senti. Gosto das provas e gosto muito dos treinos. Gosto de não pensar.
Eu gosto dos amigos na corrida e de ver caras felizes. Brincadeiras e desafios. Gosto da cumplicidade e da humildade. Gosto da minha frustração e da dos amigos na falha de um objetivo. Significa uma tentativa. Também gosto de apaparicar os outros e ser apaparicado pelos meus feitos.
Ahhhh… Não sei se isso significa que gosto de correr. Diz-me tu!" (Rui Faria)
"O desporto começou por ser uma atitude saudável. Praticava BTT e desafiaram-me para fazer uma corrida. O meu filho e o meu cunhado Vasco acompanharam-me nesta aventura e correr passou a ser uma forma de partilhar momentos em família. Com a entrada nos RUN 4 FUN,e depois nas Tartarugas Solidarias, correr passou a ser uma forma de fazer novos amigos. Depois passou para uma fase de superação, conseguir fazer coisas que nunca imaginei vir a fazer, provas de 15km, meias maratonas, trilhos e a prova rainha, a Maratona. Posteriormente passou a ser uma forma de passear o cão e de dar alegrias a esse fiel companheiro. Também é uma forma de transmitir um comportamento saudável, dos meus quatro filhos três já fizeram uma prova de 10kms e um já fez a meia maratona. Correr é também uma fuga ao stress do trabalho e um equilíbrio para as pancadas da vida. Claro que tem sido uma forma de me divertir. É um ponto de contacto com muitas pessoas, que nunca tendo corrido comigo gostam da corrida. Apesar da aparente ordem cronológica do meu texto, correr tem sido tudo isto numa desordem e simultaneidade anárquicas, porque correr é viver." (Alfredo Falcão)
"Apesar da noite cerrada, levanto-me para correr. Hábito recente que adquiri gradualmente sem justificação. Atualmente, ainda não consigo explicar o gosto e o porquê de correr.
Contrariando o corpo dormente, calço as sapatilhas preparadas de véspera. A escuridão impõe-se aquando da minha saída, minimizo o ruído junto dos restantes moradores curiosos e acostumados a tal ritual.
Sem olhar para trás e, com os pulmões moldados pela brisa fria da noite que trespassa a pele, cumprimento o sentinela de serviço sem resposta. Começo a corrida num trote lento e harmonioso, de forma a estimular os músculos, ainda, resistentes.
Circunscrita entre Tejo e a encosta, a avenida anteriormente abarrotada e oculta por entre álamos, dá lugar aos Cacilheiros ofuscados por Cruzeiros e memórias [monumentos] do passado. Palmilhando a noite, aprecio o orvalho e os apitos emanados pelos barcos em movimento, só percetíveis pela constelação dispersa pelo estuário.
Neste cenário de recolher obrigatório, surgem os primeiros indícios de vida humana por entre a escuridão, trabalhadores e corredores anónimos dignos de respeito pela sua perseverança e vivacidade.
Surpreendentemente e sem marcação prévia, surgem os amigos de ofício [corredores contemporâneos], numa partilha genuína de grandes feitos [tempos e lesões] e sonhos.
Concluída a corrida e, ainda adormecido desfruto o raiar do dia [sol] no Tejo através do vitral do quarto. Perante tal sensação momentânea de equilíbrio entre corpo e a natureza, sou grato pelas amizades, liberdade e felicidade alcançadas." (Luis Carvalho)
"Correr, aos 42 anos: um novo desporto, a integração num grupo de loucos, um iniciar cauteloso e desconfiado, de uma pessoa de meia idade, como se noticia na tv um acidente. Correr foi começar a admirar relatos de experiências. Sentir um nervoso de interiorização e de apropriação dessas aventuras. Sedimentá-las como hipóteses. Convertê-las em objectivos, de forma bruta, mas tão clara! Planear o caminho e iniciá-lo. Semanalmente, lidar com o cumprimento e aprender com os incumprimentos. Sozinha, poucas vezes. Apoiada e acarinhada, sempre. Correr é ambicionar: ultrapassar todos os limites que, na verdade, se criam, logo à partida. Sonhar, insanamente, com novas metas, confiando no prazer de percorrer, e saborear, cada metro do percurso até ao êxtase final. Correr são sensações de pele e de alma: a adrenalina do desconhecido, os corredores, os cheiros, os pisos, as cores, as sombras, a chuva, o granizo, o frio cortante, a noite e a solidão…e os sons. A nossa humanidade integrada na envolvência e dela dependendo. Correr é desespero, cansaço extremo, exaustão mental, dúvidas, fim inalcançável, ausência de esperança. É renascer de novo. Fôlego! Força! Determinação! Lutar, lutar! Sobreviver, naquele momento, o único momento que importa. Correr é o prazer de atingir o objectivo. Pessoal ou de equipa. Ou superar a sua não concretização. Correr é uma sequência de análises e de autoconhecimento. Um crescimento adulto em ambiente de criança: com festa, amizade, apoio desinteressado, brincadeiras, picardias disparatadas com bazófias agendadas. E com verdadeiro prémio finisher! E fazê-lo no aconchego da equipa e com o divertimento no apoio: Run 4 Fun." (Sandra Simões)
"Correr foi uma constante durante toda a minha vida. Por isso fico sempre confuso quando me perguntam – “Há quanto tempo corres?”, pois a corrida faz parte de mim. Muitas vezes mal acordo já estou a correr, corro até à casa de banho, tomo banho com àgua corrente (não gosto de banhos de imersão), come-se qualquer coisa também a correr, e depois é a habitual correria até ao emprego para não faltar aos compromissos matutinos. Mas isto é sem dúvida a parte mais simples da corrida. Ao longo da minha vida, precisei correr riscos, neste aspecto sempre treinei com afinco. No entanto, actualmente o que mais me preocupa é que o tempo passa por mim também a correr. Tenho cada vez mais dificuldade em acompanhá-lo. Estarei a perder capacidades atléticas? Precisarei introduzir treinos específicos? Talvez umas séries. Conhecem algum PT?" (Teodoro Trindade)
Gosto muito de ler estes notáveis textos, tão diferentes, mas tão semelhantes. Correr não é um fim, mas antes um meio para atingir um novo estado físico e psicológico no qual nos sentimos muito bem. Passando por vezes por dificuldades como lesões, dores, não acabar provas, mas....... nunca desistindo. E quando não der mais para correr, dará para caminhar que é muito agradável e que pratico há anos, cada vez mais!!
ResponderEliminarMelhor que tudo é a companhia, conhecer pessoas com quem temos algo em comum, que nos apoiam, dão conselhos, exemplos, sugestões e com as quais desenvolvemos laços de amizade, companheirismo e solidariedade. E isso é o mais importante, partilhar conquistas, mas também derrotas com quem pensa como nós. E no final......divertimo-nos. Isto é o RUN 4 FUN.