Caminhos de Santiago

Caros amigos,

Esta não é sobre corridas, mas sobre caminhadas. Julgava eu que as corridas eram mais difíceis que as caminhadas. Enganei-me............

Para se obter a "Compostela" o certificado de se ter feito o Caminho de Santiago, é necessário fazer, pelo menos, 100km a pé ou 200 km de bicicleta. Também é necessário pedir a "credencial do peregrino" que atesta que fizemos o caminho e se quisermos ficar nos albergues. Na credencial vão sendo postos os carimbos e datas das nossas passagens por albergues, restaurantes, lojas por onde passamos a caminho de Santiago.

Existem vários caminhos para Santiago de Compostela, o mais famoso dos quais, o caminho francês que tem cerca de 800 kms, com início em França em Saint Jean Pied de Port, nos Pirinéus. Faz-se, a pé, em cerca de 30 dias. Conhecemos, no nosso caminho para Santiago de Compostela, um sueco que nos disse tê-lo feito em 19 dias. E nós vimos o ritmo dele, que era muito alto.

Nós fizemos o caminho Português que pode ter vários pontos de partida, sendo o mais conhecido o que começa no Porto. O nosso início foi em Ponte de Lima no dia 30 de Agosto, 3ª feira, com perto de 150 km até Santiago. Na noite anterior, pernoitámos no albergue de Ponte de Lima, que tem óptimas condições ao preço de 3 euros por cabeça (económico......), numa camarata com cerca de 25 camas. É claro que usei os meus tampões para os ouvidos. Existem sempre alguns "roncadores"....ehehhehe.....

Saímos de Ponte de Lima por volta das 7 horas da manhã, cada um com mochilas com mais de 8 kg. E daí seguimos para Valença a 36 km, que nos levou perto de 9 horas.

O tempo estava encoberto, o que foi bom. A maior dificuldade foi a serra da Labruja, o único verdadeiro troço de montanha neste caminho. E nós levámos calçadas botas de montanha!!!! No fim do dia eu tinha uma bolha enorme, no calcanhar do pé direito. Nada que um "compeed" não possa resolver. Ficámos no albergue de Valença que tem dois quartos, para além das camaratas. Como fomos o 2º casal a chegar a rececionista deu-nos um quarto. E nesse dia dormi maravilhosamente, sem precisar de tampões nos ouvidos.

No 2º dia, quase sempre a chover, saímos de Valença ás 7 da manhã e fomos até Redondela. Nos guias dizem que são cerca de 30 km, mas na realidade, dado existir um desvio em Porrino, foram quase 40 km. Demorámos 10,5 horas. E no fim do dia eu estava muito mais em baixo do que quando acabei a minha mais difícil maratona. A bolha no calcanhar tinha alastrado da parte de baixo do calcanhar para a parte de trás do calcanhar e tinha uma nova bolha no dedo pequeno do pé direito. A Luísa também estava cansada, mas em muito melhor estado do que eu. para além de não ter quaisquer bolhas nos pés.

O albergue estava cheio pelo que ficámos num albergue privado num quarto com três beliches de duas camas. Aí vimos um sujeito que tinha vindo de Braga e que não conseguia andar mais. Para ele, o caminho acabou ali.

Fomos jantar com o nosso amigo Zoltan, o sueco que fez o caminho francês em 19 dias e tivemos uma conversa muito interessante, comparando a vida em Portugal e na Suécia. O Zoltan que é húngaro de origem , vinha de Barcelos, ia para Santiaho e depois para Finisterra, mais 3 dias de caminho. Ele é um caminheiro experimentado.

No 3º dia, saímos de Redondela perto das 9:45 depois de termos tomado o pequeno almoço pois eram "apenas" 18 km de caminho. O tempo esteve a maior parte nublado, com algumas abertas de sol. Demorámos cerca de 5,5 horas. Almoçámos em Pontevedra cerca das 15:30 num restaurante onde o menu do peregrino eram 6,5 euros. com refeição completa (económico...:).

O albergue de Pontevedra é excelente, com 2 dormitórios em beliches e com área para lavagem com máquinas de lavar roupa e de secar. Ao preço de 5 euros por cabeça, bem mais "caro" que os 3 euros nos albergues portugueses. A etapa da volta à Espanha terminou nesse dia em Pontevedra, muito perto do albergue. Só o soubemos depois.... Aproveitámos para visitar Pontevedra que é uma cidade muito bonita. E estava o Sol a brilhar, ao fim da tarde.

No 4º dia, mais 23 km de Pontevedra até Caldas dos Reis. Troço com vários pontos bonitos, com calçadas romanas, como em quase todos os dias, com exceção do 2º. Aproveitámos para molhar os pés num ribeiro muito simpático perto de Arcade que, dizem, tem das melhores ostras do Mundo. Havemos de lá voltar, para comprovar. Na parte final da caminhada fomos a falar com o Mateo, um jovem italiano de 18 anos, que com mais três amigos, todos escuteiros, entre 16 e 18 anos, estava a fazer o caminho desde o Porto. O Mateo é de Reggia de Calabria e quer entrar em Medicina. Uma conversa muito agradável

Jantámos em Caldas dos Reis com os nossos amigos Ricardo Nogueira e Paulo (dois experientes caminheiros) , mais o casal Mota num restaurante cujo dono não se devia lavar com regularidade (........pelo respetivo cheiro) mas cuja comida era agradável e ao preço de 8 euros por cabeça, ementa completa.

No 5º dia, de modo a podermos chegar mais cedo a Santiago resolvemos não ficar em Padrón e seguimos até Teo. No entanto, almoçámos em Padrón, com uma entrada dos famosos pimentos Padrón (verdes apimentados) mais uns "chipirones" e depois uma "paella" que estava muito bem. Aqui o preço não foi tão económico, mas foi muito agradável. Fizemos cerca de 27 km num total de 9 horas.

Em Teo fomos jantar com umas "tias" italianas, experientes caminheiras todas aparentando ter mais de 60 anos, que também vinham do Porto. Eram de Milão, chamavam-se Adriana, Ana e Daniela. As duas primeiras gostavam de beber um cálice de vinho do Porto no fim do jantar. Uma conversa muito interessante sobre Portugal e a Itália. Berlusconi, Mourinho, um "belo uomo" segundo a Adriana que, por acaso, era adepta do Inter. Curiosamente duas das nossas amigas italianas caminhavam com sandálias e a outra com umas Salomon XA Pro de trail. E tinham mochilas pequenas de menos de 30 litros.

No 6º dia saímos de Teo às 7 horas, ainda noite e demorámos 3,5 horas a chegar a Santiago. Fomos de imediato pedir a nossa "compostela", à oficina do peregrino. Seguimos depois para a missa do peregrino às 12:00 horas, onde já não tive lugar sentado. Tinha uma bolha enorme, desde o 3º dia, no pé esquerdo que me doía imenso. Tanto que quase não conseguia estar de pé e tinha que me sentar no chão.

A exibição do "Bota-Fumeiro" durante a missa do Peregrino é um verdadeiro espetáculo. É um contentor de incenso, preso por uma corda enorme ao teto da Catedral, que tem um mecanismo que o faz balouçar cada vez mais rápido até quase atingir a vertical. No final até houve palmas, isto durante a missa.

Em Santiago ficámos esse dia e mais o dia seguinte, num belo hotel, para aí a 50 metros da Catedral. Já não dava para albergues............ Santiago é a capital da Galiza e uma cidade muito bonita com um centro histórico magnífico com excelentes restaurantes, dos quais saliento a "Taberna do Bispo". Tem umas tapas, umas ameijoas, uns mexilhões, etc. que são de altíssima qualidade. Fomos lá jantar nas duas noites que estivemos em Santiago.

E depois seguimos para o parque da Peneda-Gerês onde passámos 4 dias. Outra zona fantástica.

Em resumo, recomendo o Caminho de Santiago que pode ser feito por razões de fé, de gosto, de prazer, mas que é uma jornada inesquecível onde se podem ver paisagens muito bonitas, conhecer pessoas muito interessantes e desfrutar das belezas naturais que existem em grande quantidade e de grande qualidade.

Runabraços

PS: Aqui estão algumas fotos seleccionadas. Foram quase 700

Comentários

  1. Parabéns à Luísa e ao João por mais uma jornada histórica.

    Escolha errada de "pneus". Talvez os teus Solomon fossem a escolha certa. Fica para a próxima.

    E mais fotos? onde estão?

    AC

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  2. Parabéns aos dois por esta Aventura! O relato dá alguma vontade de pensar em fazer...!
    Para o ano proponho participarmos na Geira Romana que se desenrola no Gerês.
    Runabraços

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  3. Só a descrição dá logo vontade de participar. Parabéns aos dois , Runtástico.

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  4. Parabéns aos dois por essa bela aventura!

    grande abraço

    Zé Carlos Santos

    Ps: agora há que aproveitar a experiência acumulada e organizar uma expedição R4F por etapas no próximo ano!

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  5. Parabéns a este dois excelentes caminheiros. Já só falta o Ironman.

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  6. Caro João e Luisa,

    Obrigado pela partilha da vossa caminhada!!

    O Caminho de Santiago tem andado nos meus planos há alguns anos mas tenho andado sempre a adiar. Conheço muitas pessoas que o fizeram e que trouxeram experiencias muito boas para além de algumas mazelas...mas nada de mais! Acima de tudo acho que deve ser uma experiencia fantástica e muito enriquecedora.

    Parabéns por mais este exemplo de persistência que nos vão habituando.

    Até breve!

    Runabraços

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  7. Grande Aventura.

    Obrigado pelo relato João

    Já vai sendo um hábito, mas os Teus relatos têm duas caracteristicas fantásticas e contraditórias :
    - ficamos com pena de não ter ido e ao mesmo tempo, ficamos com a sensação de termos estado presentes :) .

    Parabéns aos dois.
    Runabraços

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  8. Jorge,

    A Geira Romana é um dos meus desejos para o próximo ano e até já escolhi o hotel. O hotel das Águas do Gerês, que está muito bom. Estivemos no Gerês na 6ª feira. Entrámos por Espanha pela fronteira da Portela do Homem, junto à Geira.

    Runabraços

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  9. Parabéns a ambos. Obrigado pelo relato. Resumido mas muito interessante e apelativo.
    Esta é uma boa época para caminhadas longas, ainda sem terrenos muito enlameados.
    Actividade que faz bem à saúde cardio-vascular, apesar das bolhas e de outras maleitas.
    Afinal o homem nasceu principalmente para caminhar e "alombar" com kilos de mantimentos, mas também foi obrigado a correr.
    Antes de se tornar um animal sedentário.

    Uma dúvida: Um percurso com estas características e desta dimensão, se não estiver bem sinalizado, será facil ficar perdido.
    Como está sinalizado este "Caminho"? Um percurso mal sinalizado, não é um trekking mas uma prova de orientação.

    RunAbraços.

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  10. Tantas nacionalidades a partilharem o mesmo percurso de fé.

    Mesmo com as bolhas e as dificuldades a fé supera.

    Parabéns João e Luísa.

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  11. Carlos Melo,

    O percurso está muito bem sinalizado com diversos indicadores, sendo o mais comum as setas amarelas.

    Existem também azulejos com a "vieira" a indicar o caminho, bem como marcos com a indicação dos km que faltam para chegara Santiago de Compostela.

    Curiosamente foi numa cidade, Porrino, que nos perdemos, uma única vez. Mas aí basta perguntar à pessoas, em caso de dúvida.

    Caminhaabraços

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  12. Parabéns a ambos por mais uma fascinante aventura e ao João pela excelente crónica!
    Realmente uma caminhada destas deve ser uma prova que testa a resistência e tenacidade, a não menosprezar.
    Achei particularmente interessante o convívio com outros caminheiros e a partilha de diferentes experiências.

    Grande abraço

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  13. Ultreya et Suseya!

    Muitos Parabéns pelo Caminho. As bolhas fazem parte da historia de todos os caminheiros, mas com treino tal como nas corridas podem-se evitar. O problema é que os musculos e articulações que trabalham nas caminhadas não são os mesmos que na corrida, daí que quem pratica um destes desportos não está automaticamente apto para o outro.

    O Caminho de Santiago está na minha lista de prioridades e pensei seriamente em fazê-lo em Junho passado, mas depois desisti a favor do Monte Perdido. O caminho que fez é o que menos me agrada e queria mesmo fazer o caminho moçárabe a partir de Sanabria, é mais dificil mas é mais rural so falta mesmo tempo...

    Abraço boas caminhadas e melhores corridas

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  14. Muito obrigado pela partilha desta vossa aventura.
    Julgo que a longa caminhada foi somente um dos desafios superados e suspeito que talvez não tenha sido o maior.
    Mas em boa companhia (e com acompanhamento médico permanente) é mais fácil ultrapassar as dificuldades.

    Muitos parabéns Luisa e João.

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  15. Fantástica aventura. Um dia hei-de fazer um destes caminhos, seja a pé ou de bicicleta. Obrigado por partilharem

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  16. Parabens, ao João e à Luisa.
    Já tive a oportunidade de fazer o Caminho Portugues, de Bicicleta, uma das quais com o nosso Bruno Silva.
    Lendo agora os relatos da vossa peregrinação, relembro com saudade vários dos bons momentos que passei. Abraço de parabens.

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  17. E a pensar que este ano, algures por Julho, me passou pela cabeça fazer o caminho francês...mas o calor...e a confusão que deveria ser o dito Caminho em Agosto fez-me mudar de planos...ao invés várias centenas de kms pela região vinícola da Provence Alps Cote dÁzur...

    E relembro as palavras da nossa amiga e colega Ana Grosnik, corredora encartada que fizera o caminha em Junho e me dissera que andar era mais díficil que correr...coisa que o João Ralha confirma!

    Quanto ao mais parabéns pela "juventude", pelo arrojo e pelo relato!

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