Ultra-Trilhos de Mértola

Texto de: João Abreu

(Março 7, 2019)

A primeira ULTRA 

Sem saber por onde começar, talvez deva de começar pelo início. O início leva-me até ao dia 28-10-2018, o que aconteceu nesse dia 28? Pois bem, nesse dia 28 de Outubro, faço juntamente com os RUN 4 FUN o meu primeiro treino em trilhos, coisa que até então eu desconhecia totalmente... Trilhos? Sem saber onde iria parar e o que me esperava, no dia 28 lá vou eu com uma mochila (desportiva, não de trail nem de corrida) e uns ténis de estrada para essa que seria a minha primeira experiência em trilhos. Juntamente com um grupo de pessoas sempre bem dispostas e sempre prontas a ajudar fomos até Sintra para aquela que seria a minha primeira experiência em trilhos... Brutus foi o nome desse treino que marcaria a minha primeira experiência em trilhos, treino esse que terminei com vontade de voltar novamente a Sintra para conseguir voltar a correr por todos aqueles lugares fantásticos e fascinantes que tínhamos percorrido. Após fazer um primeiro treino em trilhos, onde eu iria buscar a ideia de que, em menos de 6 meses estaria a fazer uma ULTRA?

Dia 16 de Janeiro, vejo uma publicação feita pelo Rui Faria onde o objectivo era arranjar alguns atletas para os Trilhos de Mértola, partindo a ideia de irmos a Mértola do Luís Afonso.

Sem saber o que me iria esperar em Mértola, aceitei o convite, embora estivesse indeciso entre os 26 km e os 46 km, nesse aspecto tive a ajuda/incentivo da Marina que me encorajou a ir para os 46kms dizendo que se ela conseguia eu também iria conseguir, também me disse que se fosse  para os 26 kms teria de ficar depois à espera dos que fossem fazer os 46kms. Como não sou de baixar os braços perante um desafio aceitei o desafio de ir a Mértola e fazer os 46kms, embora ficasse durante dois ou três dias a pensar se era mesmo aquilo que queria. Pensei para mim, vou eu a Mértola só para fazer 26kms? Isso não vale a viagem, se vou é para fazer os 46 kms, aí foi quando começaram a surgir as primeiras dúvidas, e se não conseguir terminar? 46kms? Nunca fiz essa distância nem em estrada nem em lado nenhum, como vou eu fazer os 46 kms?

Sem saber a logística e material, tirei todas as dúvidas que tinha com o Rui Faria, desde o que é o "controlo zero" até ao "material obrigatório"...

Aproximando-se o dia da prova, no dia anterior, ao final do dia partimos em direcção a Mértola (eu, Francisco Afonso e a sua esposa), no caminho para Mértola, dou por mim a pensar que está quase no dia da prova, estava a menos de 24horas de realizar a minha primeira ULTRA, a certa altura dou por mim a olhar para as placas na autoestrada que diziam, daqui a 20km "estação de serviço" e eu pensava para mim, "bem se daqui a 20kms é a próxima estação de serviço, vou ver o que terei de correr amanhã sendo que será duas vezes esta distância de 20kms mais 6kms" desisti de olhar para a janela nos primeiros kms e distrai-me a mexer no telemóvel. Ao chegarmos a Mértola à hora de jantar, encontramos os restantes atletas que no dia seguinte estariam a conquistar Mértola. No fim do jantar, o senhor do restaurante pergunta se iríamos para a corrida no dia seguinte, à qual o Francisco Afonso responde que sim, que ele iria para os 26kms e que eu iria para os 46kms, o senhor sorriu e disse que ele iria para os 14kms, porque depois teria de vir trabalhar. Mas deixou-me de antemão que somente depois do km 15 é que iria ter uns kms a direito e que era uma prova difícil. Fiquei com vontade de mudar para os 14kms mas pensei para mim, vim até aqui não é agora que vou deitar a toalha ao chão.

Dia da prova:

Com o despertador para despertar às 5:55h, deparo-me a acordar uns minutos antes do mesmo despertar. Estava na altura de levantar, ultimar o que faltava para a prova e ir tomar o pequeno-almoço (segundo o que eu disse ao Rui Faria, era no pequeno-almoço que estava o segredo para aguentar a prova). Após tomarmos o pequeno-almoço e sairmos do hotel é hora de irmos ao encontro do autocarro que nos iria deixar na Mesquita, local da partida.

A hora da partida aproximava-se, não havia volta a dar, estava a chegar o momento, a ansiedade estava a dar sinais de que estava bem presente...

Algum tempo depois é dada a partida, e foi aí o início desta aventura que seria de 46kms.

Como combinado com a Marina, partimos juntos rumo aos 46kms que nos esperavam, os primeiros kms foram o suficiente para que aquela adrenalina se acalmasse, era altura de aproveitar ao máximo aqueles 46 kms que estavam por fazer. Não me recordo qual era o km mas reparei que a Marina e eu tínhamos deixado de estar um perto do outro e foi aí que apareceu o meu padrinho Teodoro Trindade, um pouco mais à frente voltamos a encontrar a Marina que me diz "João vai com o Teodoro" pensei duas vezes antes de partir com o Teodoro, porque tínhamos dito que iríamos fazer a prova juntos, mas segui as orientações da Marina e segui em frente, pensando para mim, "daqui a uns kms a Marina irá passar por mim, não haverá problema" coisa que veio a acontecer uns kms mais à frente. A partir daí eu e o Teodoro partimos em direcção aos longos kms que tínhamos pela frente, mal sabia eu o que esses kms me iriam reservar... Até então sentia-me bem e confiante de que seria difícil mas que iria conseguir terminar aqueles 46kms. Mais à frente e após uns largos kms sou picado por uma abelha/vespa na cabeça, a partir daí, senti que não seria naquele dia que iria terminar os 46kms, senti que estava quase a chegar a meio da prova e que estava deitada a toalha ao chão, após a picada continuei a correr com o Teodoro que não me deixou ficar sozinho por um segundo e que  abdicou de continuar a prova para ficar comigo e seguir ao meu ritmo... Minutos depois começam a surgir as dores da picada, após uns kms encontrei o carro dos bombeiros e optei por pedir gelo para minimizar a dor, foi aí que passados 10 min começaram a surgir as tonturas e a vontade de vomitar, era inevitável, tive de me sentar e pôr o gelo na cabeça, sempre acompanhado do meu padrinho (Teodoro Trindade) que me disse com tranquilidade "vamos acabar a prova juntos", sentia-me tonto e sem forças mas pensava que estava a prejudicar a prova dele e que isso não era justo, após estarmos sentados passa por nós a Marina e diz para o Teodoro avançar que ela ficaria comigo, ao qual o Teodoro disse que não iria avançar para a Marina partir que nós iríamos pouco tempo depois, e assim foi, passado algum tempo depois lá fomos nós, devagar, com dores e mau estar da minha parte , mas fui, por mim não teria dado nem 2 passos, mas tive ao meu lado uma pessoa 5* que esteve sempre lá para me apoiar e partimos para os kms que nos restavam, uns kms à frente voltou tudo ao mesmo, tonturas, vontade de vomitar, e foi inevitável, tive de me sentar de novo, e quem esteve ao meu lado novamente e não me deixou por 1 segundo? Teodoro Trindade. Ao fim de estarmos algum tempo parados, onde eu me tentava recompor, avistamos o Orlando Ferreira, o Orlando que seria juntamente com o Teodoro as minhas "pernas" que me iriam levar até à meta. Após aquele compasso de espera de alguns minutos, levantei-me embora a ver tudo à roda e partimos em direcção à meta que estava ainda a uns bons kms, pensei em desistir e disse para eles continuarem que eu iria ao meu ritmo, eles disseram que eu não iria ficar para trás e assim foi, não fiquei para trás graças a estes dois excelentes seres humanos, foi ali que senti o clique e que pensei, "chega de prejudicar a prova deles, eles estão a fazer isto por mim, esperaram por mim, então está na altura de fazer algo por eles" e foi aí que partimos em direção à meta, embora fosse um pouco mais atrás, eles foram cruciais nos kms restantes. Após 46kms de muitos baixos e alguns altos, estávamos na meta. Tudo isto só foi possível graças a estes dois homens com H grande que abdicaram de ir ao seu ritmo para me "arrastar" até à meta. Agradeço aos dois pela atitude que tiveram. Vocês são sem dúvida um exemplo a seguir.

Muito mais importante do que a prova em si, foi a força e a determinação que estes dois Homens demonstraram para comigo. De agora em diante, sempre que pensar em desistir, irei lembrar-me desta prova e de cada um de vocês e irei nem que seja de rastos até ao fim da prova.

OBRIGADO Orlando Ferreira e Teodoro Trindade.

-- João Abreu