Ultra Trail do Piodão: o grande derby do último sábado.


NOTA: texto seguinte é uma transcrição de um original da autoria de Rúben António Costa, publicado no facebook (https://www.facebook.com/cluberun4fun/posts/2285976168294833/) a 3 de abril de 2017).

Ultra Trail do Piodão: o grande derby do último sábado.

Quando uma prova faz parte do campeonato nacional toda a elite está presente elevando o nível competitivo, a emoção e a constante incerteza do resultado final. Foi isto mesmo o que se passou sábado no Piodão, provavelmente os 50 km mais competitivos das últimas épocas desportiva.

Logo na abordagem ao primeiro single track deu para perceber que ninguém estava ali para facilitar. O grupo tinha-se posicionado estrategicamente à frente do vassoura. Costa adiantou-se ligeiramente para tentar ganhar vantagem no primeiro piso técnico mas Ribeiro sempre atento aproveita-se da primeira descida complicada para o ultrapassar e começar a ganhar distância em relação aos demais. Lá atrás Raposo e Simões estudavam-se mutuamente.

Na primeira subida Ribeiro consolida vantagem que o coloca fora do horizonte dos adversários desmoralizando-os. Costa tenta não perder o contacto visual mas Ribeiro aplicou todos os seus conhecimentos de crossfit não dando hipóteses. Sandra surpreende Raposo que por estas alturas devia estar a arrotar ultralevur 250 e alcança Costa. Costa ainda simula um engano atraindo Simões para uma escadaria mas Simões não cede e mantém-se firme junto a Costa tendo chegado juntos ao segundo abastecimento onde entretanto já se encontrava Raposo que kilómetros antes os tinha surpreendido. Ribeiro já tinha passado à muito. Por estas alturas já muitos pensavam que o primeiro lugar estava atribuído.

No ataque á segunda subida, uma das mais duras, Costa e Simões conseguem ultrapassar Raposo que parecia não estar nos seus dias. Engano. Após as primeiras eólicas, Raposo ultrapassa SImões e junta-se a Costa na abordagem às segundas eólicas. Simões não descola e mantém-se poucos metros atrás. Ribeiro continuava a liderar com uma vantagem confortável.

Primeiras descidas. Raposo impõem respeito e abandona Costa. Simões aproveita-se das fragilidades de Costa e alcança-o tendo chegado juntos ao alcatrão. Em piso sólido Costa aplica a sua velocidade e chega isolado ao terceiro abastecimento onde já estava Raposo.

No terceiro abastecimento tudo acontece. Raposo não perde muito tempo e arranca primeiro. Ribeiro chega em último. Como? Tinha-se enganado. Perde a liderança. Simões esconde-se na casa de banho como forma de desorientar os demais. Costa, desesperado, pensando que Simões já tinha partido, arranca de imediato em ritmo forte para tentar não perder distância cometendo alguns erros que lhe poderiam ter saído caros. Entretanto Simões e Ribeiro saem praticamente par-a-par. Passados alguns quilómetros Costa avista Raposo. Onde está Simões? -pergunta-se. Fica confuso mas não perde o norte.

Ordem de chegada ao quarto abastecimento: Raposo, Costa, Simões e Ribeiro. Juntam-se. Trocam impressões. Estudam-se mutuamente. Quem estará mais cansado? Quem será o primeiro a borregar? Incógnita. BIfanas e cerveja.

Terceira subida, a mais difícil, a serpente. Ritmo intenso, não há tempo para parar e respirar. Topo: Raposo, Costa, Ribeiro. Simões perde alguma distância que vai recuperar nas descidas que se seguem conseguindo alcançar Costa que tem que se esmerar para chegar primeiro ao controlo horário seguinte: um ou dois segundos. Raposo já tinha passado. Ribeiro chega um pouco depois.

Raposo, Costa, Simões, Ribeiro. É neste registo que chegam ao topo da última subida - o "alhinho" como foi mais tarde carinhosamente apelidada por Ribeiro- tendo todos se juntado mais uma vez nos abastecimentos. Costa, o único que conhecia o terreno, sai rápido sabendo que a descida técnica seguinte podia decidir tudo. Raposo não se deixou surpreender e ultrapassa-o. Simões sai um pouco depois mantendo pressão sobre quem ía à frente. O "alhinho" tinha feito mossa em Ribeiro que sai em último.

Estradão aos "esses". Raposo, Costa a 20 segundos e Simões a 35 segundos a 8 km da meta. Tudo estava em aberto. Passados cerca de 1 km Costa impõem um ritmo infernal surpreendendo Raposo, ultrapassado-o. Raposo tarda a reagir. Costa empolga-se mas Raposo estava forte e retoma a liderança. Simões atrasa-se, o ritmo era brutal (5:15).

Ultimo abastecimento. Costa joga a última cartada: praticamente não pára e sai primeiro que Raposo mas Raposo é experiente: "Estes são os teus terrenos, vai tu à frente", diz. Impossível. As ousadias de Costa fazem-se pagar. Náuseas. Pára. "Não estou bem, segue tu ... até já". Aquele "até já" ... Raposo segue. Costa retoma o passo mas lento. Instala-se a dúvida no ar. Será que Simões ou Ribeiro conseguem alcançar Costa? Costa não faz ideia como estão as coisas atrás de si. Treme a qualquer ruído, ao eco dos seus próprios passos: serão eles? Vão ser 2.8 km de angústia, sempre a olhar para trás.

Classificação final:

250 Raposo (8:22:17)
252 Costa (+2:51)
255 Simões (+7:14)
258 Ribeiro (+11:46)

Emocionante.

Autor: Rúben António Costa
(3 de Abril de 2017)




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